30 de novembro de 2008

Revolta de um professor com o modelo de avaliação.

MODELO DE AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO DE PROFESSORES

AVALIADORES

Presidente do Conselho Executivo avalia:
- Assiduidade
- Grau de cumprimento do serviço distribuído
- Progresso dos resultados escolares dos alunos e redução das taxas de abandono tendo em conta o contexto socio-educativo
- Participação nas actividades da escola
- Acções de formação realizadas
- Exercício de outros cargos de natureza pedagógica
- Dinamização de projectos de investigação
- Apreciação dos encarregados de educação, desde que haja concordância do docente e nos termos a definir no regulamento da escola

Coordenador do Departamento Curricular. Avalia a qualidade científico-pedagógica do docente com base nos seguintes parâmetros:

- Preparação e organização das actividades lectivas
- Realização das actividades lectivas
- Relação Pedagógica com os alunos
- Processo de avaliação das aprendizagens dos alunos



FASES DA AVALIAÇÃO


1.ª fase

Objectivos e indicadores:

- O Conselho Pedagógico da escola define os seus objectivos quanto ao progresso dos resultados escolares e redução das taxas de abandono, que são elementos de referência para a avaliação dos docentes.
- O Conselho Pedagógico da escola elabora os instrumentos de registo de informação e indicadores de medida que considere relevantes para a avaliação de desempenho.


2.ª fase

Objectivos individuais:

- No início de cada ciclo de avaliação de dois anos, o professor avaliado fixa os seus objectivos individuais, por acordo com os avaliadores, tendo por referência os seguintes itens:
- Melhoria dos resultados escolares dos alunos
- Redução do abandono escolar
- Prestação de apoio à aprendizagem dos alunos incluindo aqueles com dificuldade de aprendizagem
- Participação nas estruturas de orientação educativa e dos órgãos de gestão da escola
- Relação com a comunidade
- Formação contínua adequada ao cumprimento de um plano individual de desenvolvimento profissional do docente
- Participação e dinamização de projectos

Nota: Na falta de acordo quanto aos objectivos prevalece a posição dos avaliadores


3.ª fase

Aulas observadas:
- O coordenador de departamento curricular observa, pelo menos, três aulas do docente avaliado em cada ano escolar
- O avaliado tem de entregar um plano de cada aula e um portfólio ou dossiê com as actividades desenvolvidas

4.ª fase
Auto-avaliação:
- O professor avaliado preenche uma ficha de auto-avaliação, onde explicita o seu contributo para o cumprimento dos objectivos individuais fixados, em particular os relativos à melhoria das notas dos alunos
- Os professores têm de responder nas fichas de auto-avaliação a 13 questões (pré-escolar) e 14 questões (restantes ciclos de ensino)

5.ª fase

Fichas de Avaliação:
- O presidente do conselho executivo e o coordenador do departamento curricular preenchem fichas próprias definidas pelo Ministério da Educação, nas quais são ponderados os parâmetros classificativos
- Os avaliadores têm de preencher uma ficha com 20 itens cada, por cada professor avaliado
- O coordenador do departamento curricular preenche uma ficha com 20 itens, por cada professor avaliado
- O presidente do conselho executivo tem de preencher uma ficha com 20 itens, por cada professor avaliado
- As pontuações de cada ficha são expressas numa escala de 1 a 10

6.ª fase

Aplicação das quotas máximas:
- Em cada escola há uma comissão de coordenação da avaliação de desempenho formada pelo presidente do Conselho Pedagógico e quatro professores titulares do mesmo órgão, ao qual cabe validar as propostas de avaliação de Excelente e Muito Bom, aplicando as quotas máximas disponíveis.

7.ª fase

Entrevista individual:
- Os avaliadores dão conhecimento ao avaliado da sua proposta de avaliação, a qual é apreciada de forma conjunta.8.ª faseReunião Conjunta dos Avaliadores
- Os avaliadores reúnem-se para atribuição da avaliação final após análise conjunta dos factores considerados para a avaliação e auto-avaliação. Seguidamente é dado conhecimento ao avaliado da sua avaliação.

SISTEMA DE CLASSIFICAÇÃO:
- Excelente, de 9 a 10 valores
- Muito Bom, de 8 a 8,9
- Bom, de 6,5 a 7,9
- Regular, de 5 a 6,4
- Insuficiente, de 1 a 4,9

EFEITOS DAS CLASSIFICAÇÕES:
- Excelente durante dois períodos seguidos de avaliação reduz em quatro anos tempo de serviço para ser professor titular
- Excelente e Muito bom reduz em três anos tempo de serviço para ser professor titular
- Dois Muito bom reduz em dois anos tempo de serviço para ser professor titular- Bom não altera a normal progressão na carreira.
- Regular ou Insuficiente implica a não contagem do período para progressão na carreira
- Dois Insuficiente seguidos ou três intercalados implica afastamento da docência e reclassificação profissional.

(in Jornal 24 horas, acessível a todos os portugueses)

Diz-se tanto que os professores não querem ser avaliados… que estão todos é a ser manipulados pelos comunistas (será que ainda comem crianças ao pequeno-almoço, como se dizia quando cheguei a Portugal, em 1976?)… que todos os outros funcionários o são e de modo rigoroso… que no sector privado toda a gente presta contas e tudo funciona, etc e tal…
Pergunto: CONHECEM QUALQUER OUTRO SECTOR PROFISSIONAL QUE PASSE POR ESTE "HORROR", acima descrito? Digam-me qual... enviem-me o modelo de avaliação dos médicos, engenheiros, enfermeiros, jornalistas, ministros, economistas, gestores (do BPN, por exemplo), supervisores, carpinteiros, coveiros… seja lá o que for que seja IGUAL ao que querem fazer aos professores!!!

Digam-me que profissão tem de escrever SUMÁRIOS exaustivos do que faz em cada hora de trabalho (os enfermeiros, por exemplo, no fim do turno têm de escrever registos, mas depois não levam trabalho para casa)… que tem de ELABORAR portefólios completos de TODA a sua actividade… e que TEMPO é que resta para fazer aquilo para que existe, que, no caso dos professores, é (devia ser) PREPARAR E DAR AULAS! Enviem-me, por exemplo, o modelo de avaliação que avaliou a ministra Maria de Lurdes Rodrigues enquanto foi professora… antes de ser socióloga… ou, enquanto tal, enquanto foi professora no ISCTE! Existe esse modelo… ou na altura ela era CONTRA o que agora FAZ?! Enviem-me o número de pessoas que trabalham no Ministério da Educação e que JÁ FORAM AVALIADAS! Não sabem?! Que tal investigarem? Hein? Dá muito trabalho? A Ministra vai responder como a colega da Saúde? Pois é... pois é… E ainda há gente por aí a achar que os professores são derrotistas e que não querem ajudar o país a avançar?!… Tssssss… tsssss...

Pois eu digo: ASSIM NÃO SE PODE SER PROFESSOR! DEIXEM-NOS ENSINAR!

Nelson Pires, Coimbra.

B.P.N., um grupo com nomes sonantes...

"O Presidente da República (PR), Cavaco Silva, foi um dos muitos accionistas que a Sociedade Lusa de Negócios (SLN) cativou para o seu capital ao longo dos anos. Cavaco teve um pequeno número de acções que manteve por pouco tempo, tendo-as vendido em 2003, segundo informação prestada ao Expresso em Janeiro pelo próprio Banco Português de Negócios (BPN). Também a sua filha Patrícia foi accionista da SLN. O Expresso perguntou ao PR por que motivo entrou no capital da SLN e saiu pouco tempo depois, mas fonte oficial da Presidência disse que não há comentários sobre este assunto. O grupo sempre foi considerado próximo do PSD. Um dos seus maiores accionistas é Joaquim Coimbra, membro do Conselho Nacional do PSD. Arlindo Carvalho, ex-ministro da Saúde de Cavaco, é outro dos accionistas."
É impressionante como esta gente come toda da mesma gamela. Então não foi o Dias Loureiro que se apresentou todo solícito para fazer a apologia do engenheiro (que afinal o não é) a quem tiveram a falta de senso de chamar de menino de oiro? Pois foi! E isso não se faz à borla... Esperemos pelo desenrolar do novelo porque sobre este caso vai concerteza correr ainda muita tinta.



Notícia aqui.

29 de novembro de 2008

Ivan Meets G.I. Joe. The Clash.

So you're on the floor, at 54
Think you can last - at the Palace
Does your body go to the to and fro?
But tonight's the night - or didn't you know
That Ivan meets G.I. Joe
He tried his tricks- that Ruskie bear
The United Nations said it's all fair
He did the radiation - the chemical plague
But he could not win - with a cossack spin
The Vostok Bomb - the Stalin strike
He tried every move - he tried to hitch hike
He drilled a hole - like a Russian star
He made every move in his repertoire
When Ivan meet G.I. Joe
Now it was G.I. Joe's turn to blow
He turned it on - cool and slow
He tried a payphone call to the Pentagon
A radar scan - a leviathan
He wiped the Earth - clean as a plate
What does it take to make a Ruskie break?
But the crowd are bored and off they go
Over the road to watch China blow!
When Ivan meets G.I. Joe

Ivan Meets G.I. Joe, The Clash, álbum triplo "Sandinista"

Os principais objectivos da política externa dos Estados Unidos da América X. Por Noam Chomsky.

Ensinando uma lição à Nicarágua.

Não foi apenas o caso de El Salvador que foi ignorado pelas principais correntes da comunicação de massa norte-americana durante a década de 1970. Nos dez anos anteriores à queda de Anastasio Somoza, em 1979, a televisão norte-americana - todas as redes - dedicaram exactamente uma hora à Nicarágua, inteiramente relacionada com o terremoto de Manágua, em 1972. De 1960 a 1978, o "The New York Times" publicou três editoriais sobre a Nicarágua. Não porque algo estivesse a acontecer, mas sim porque qualquer coisa que lá estivesse a acontecer não seria digna de registo. A Nicarágua não foi motivo de preocupação enquanto o regime tirânico de Somoza não foi desafiado. Quando o seu regime foi desafiado pelos sandinistas, no final dos anos 1970, os EUA tentaram instituir o chamado "Somozismo sem Somoza", isto é, todo o sistema corrupto seria mantido intacto, mas com outra pessoa na liderança. Como isso não funcionou, o então presidente Carter tentou manter a Guarda Nacional de Somoza como uma base para a potência norte-americana.

A Guarda Nacional sempre foi notoriamente brutal e sádica. Em junho de 1979, levou a cabo uma
série maciça de atrocidades na guerra contra os sandinistas, bombardeando bairros residenciais em Manágua, matando dezenas de milhares de pessoas. Por essa altura, o embaixador norte-americano enviou um telegrama à Casa Branca dizendo que seria desaconselhável mandar a Guarda Nacional suspender o bombardeamento, porque isso poderia interferir na política de manter a Guarda no poder e deixar os sandinistas de fora. O nosso embaixador na Organização dos Estados Americanos (OEA) também falou a favor do "Somozismo sem Somoza", mas a OEA rejeitou prontamente a sugestão. Poucos dias depois, Somoza voou para Miami com o que restava do Tesouro Nacional, e a Guarda desmoronou. O governo Carter levou os comandantes da Guarda para fora do país em aviões com sinais da Cruz Vermelha (um crime de guerra) e começou a reconstituí-la nas fronteiras da Nicarágua. Os EUA também usaram a Argentina como uma intermediária. Naquela época, a Argentina estava sob o comando de generais neonazistas, que deram uma folga na tortura e no assassinato da sua própria população para ajudar a restabelecer a Guarda logo rebatizada de os contras ou "guerreiros da liberdade”. Reagan utilizou-os para lançar uma guerra terrorista em grande escala contra a Nicarágua, combinada com uma guerra económica, que foi muito mais letal ainda. Foram também intimidados outros países para que não enviassem ajuda. Mesmo assim, apesar dos níveis astronómicos da ajuda militar, os EUA não conseguiram criar uma força militar viável na Nicarágua. Isso foi realmente notável, analisando bem. Nenhuma guerrilha no mundo obteve tantos recursos, mesmo remotamente, como os contras obtiveram dos EUA. Provavelmente poderia iniciar-se uma insurgência guerrilheira, na regiões montanhosas dos Estados Unidos, com tais recursos.
Por que os EUA foram tão longe na Nicarágua? A organização de desenvolvimento internacional a Oxfam - explicou os motivos verdadeiros ao declarar que na sua experiência de 76 anos em países em desenvolvimento "a Nicarágua foi... excepcional no esforço e no firme compromisso daquele governo... em melhorar as condições de vida do povo e em estimular a sua participação activa no processo de desenvolvimento". Dos quatro países centro-americanos onde a Oxfam teve presença significativa (El Salvador, Guatemala, Honduras e Nicarágua), somente na Nicarágua houve um real e substancial esforço em resolver as injustiças da posse da terra e em estender os serviços médicos, educacionais e agrícolas às famílias de camponeses pobres.
Outras organizações contaram histórias semelhantes. No início da década de 1980, o Banco
Mundial considerou "alguns sectores da Nicarágua extraordinariamente mais bem-sucedidos do que em qualquer outra parte do mundo". Em 1983, o Banco Interamericano de Desenvolvimento concluiu que "a Nicarágua fazia notáveis progressos no sector social e estava a lançar bases para um desenvolvimento socio-económico a longo prazo”.
O sucesso das reformas sandinistas aterrorizaram, então, os estrategas norte-americanos. Eles
sabiam que, "pela primeira vez, a Nicarágua tinha um governo que se interessava pelo povo,
conforme afirmou José Figueres, o pai da democracia na Costa Rica. Embora Figueres tenha sido o principal líder democrático na América Central durante quarenta anos, as suas inaceitáveis
observações sobre o mundo real foram completamente censuradas pela comunicação de massa norte-americana. O ódio provocado pelos sandinistas por estes tentarem dirigir recursos aos pobres (sendo até bem sucedidos nisso) foi realmente magnífico de se observar. Praticamente todos os estrategas políticos dos EUA compartilharam esse ódio, atingindo um verdadeiro frenesim. Nos idos de 1981, um membro da Secretaria de Estado alardeou que nós iríamos "transformar a Nicarágua na Albânia da América Central", isto é, pobre, isolada e politicamente radical, de modo a que o sonho sandinista de criar um modelo novo e exemplar para a América Latina seria um fracasso. George Shultz chamou aos sandinistas "um cancro, bem aqui perto das nossas terras", que tinha de ser destruído. Na outra ponta do cenário político, um líder do Senado, o liberal Alan Cranston, declarou que, se não fosse possível destruir os sandinistas, teríamos então de deixá-los "apodrecer no [seu] próprio pus”. Então, os Estados Unidos lançaram um triplo ataque contra a Nicarágua. Primeiro, exercendo uma extrema pressão sobre o Banco Mundial e o Banco Interamericano de Desenvolvimento para suspenderem todos os projectos de assistência ao país. Segundo, lançaram a guerra dos contras
juntamente com uma guerra económica ilegal para acabar com o que a Oxfam correctamente chamou de "a ameaça de um bom exemplo".

Os terríveis ataques terroristas dos contras, sob ordens dos EUA, em direção aos "alvos leves"
contribuíram, juntamente com o boicote económico, para o fim de toda e qualquer esperança de
desenvolvimento económico e reforma social. O terror norte-americano assegurou que a Nicarágua não desmobilizasse o seu exército e enviasse os seus parcos e limitados recursos para a reconstrução das ruínas, que foram deixadas pelos ditadores apoiados pelos EUA e pelos crimes dos funcionários de Reagan. Uma das mais respeitáveis correspondentes da América Central, Julia Preston, escreveu (trabalhava na época para o "Boston Globe") que "autoridades do governo afirmaram estar contentes em ver os contras debilitarem os sandinistas, forçando-os a desviar os seus escassos recursos para a guerra e afastando-os, assim, dos programas sociais . Aquilo era fundamental, já que os programas sociais eram o coração de um bom exemplo que poderia contaminar outros países da região e corromper o sistema americano de roubo e exploração. Recusámo-nos, até mesmo, a prestar ajuda na hora da catástrofe. Em 1972, após um terramoto, os EUA enviaram uma considerável soma de recursos em auxílio à Nicarágua, sendo que a maior parte desses recursos foi roubada por Somoza. Entretanto, em 1988, quando um desastre natural - o furacão Joan - abalou a Nicarágua, nós não enviámos sequer um centavo, porque, se o tivéssemos enviado, este centavo provavelmente teria chegado ao povo e não aos bolsos de um bandido rico. Ainda pressionámos os nossos aliados a enviarem pouca ajuda.
A devastação do furacão mais a perspectiva bem-vinda de fome em massa e os danos ecológicos, a longo prazo, ajudaram os nossos esforços (ou reforçaram os nossos objetivos). Nós queríamos que os nicaraguenses morressem de fome para que pudéssemos acusar os sandinistas de má gestão económica. Já que não estavam sob o nosso controle, deveriam sofrer até a morte. Terceiro, usámos ardis diplomáticos para esmagar a Nicarágua. Como escreveu Tony Avirgan no
jornal costarriquenho "Mesoanzerica", "os sandinistas caíram numa trama perpetrada pelo presidente costarriquenho Oscar Arias e outros presidentes centro-americanos, o que lhes custou as eleições de fevereiro [1990]". Para a Nicarágua, o plano de paz de agosto de 1987 era um bom negócio, lembrou Avirgan: eles adiantariam as eleições nacionais em alguns meses e permitiriam a observação internacional, como já tinham feito em 1984, "em troca de terem os contras desmobilizados e a guerra levada a um fim...
O governo nicaraguense cumpriu o que foi exigido pelo plano de paz, entretanto, ninguém mais
prestou a mais leve atenção ao plano. Arias, a Casa Branca e o Congresso nunca tiveram a mínima intenção de cumprir qualquer aspecto do plano. Os EUA triplicaram virtualmente os vôos da CIA em reforço aos contras. Em poucos meses, o plano de paz estava totalmente sepultado. Assim que a campanha eleitoral começou, os Estados Unidos tornaram bem claro que o embargo económico, que estava a estrangular o país, e o terror dos contras continuariam se os sandinistas ganhassem a eleição. Teríamos de ser no mínimo nazistas ou estalinistas incorrigíveis para considerar uma eleição conduzida sob tais condições como justa e livre. Ao sul das nossas fronteiras, poucos sucumbiram a tais ilusões. Se uma coisa como essa tivesse sido praticada pelos nossos inimigos,... eu deixo a reacção dos meios de comunicação por conta da sua imaginação. O incrível foi que os sandinistas ainda obtiveram 40% dos votos, enquanto as manchetes do "The New York Times" proclamavam que os americanos estavam "unidos na alegria" com essa "vitória do jogo limpo americano”. As façanhas dos Estados Unidos na América Central, nos últimos 15 anos, são uma enorme tragédia, não só pelo avassalador custo humano, mas também porque há uma década havia reais perspectivas de progresso em direcção a uma democracia significativa, comprometida com as necessidades humanas, já com os primeiros sucessos visíveis em El Salvador, Guatemala e Nicarágua. Esses esforços poderiam ter funcionado e ensinado lições úteis a outros flagelados com problemas semelhantes, o que logicamente era o que os estrategas norte-americanos mais temiam. A ameaça foi abortada com sucesso, talvez para sempre.

28 de novembro de 2008

Para acompanhar o caso BPN.

Se quiserem chafurdar na lama do caso BPN fica o link com actualização permanente:


http://pauloquerido.net/caso-bpn/

27 de novembro de 2008

Os principais objectivos da política externa dos Estados Unidos da América IX. Por Noam Chomsky.

A crucificação de El Salvador.




Durante muitos anos, a repressão, a tortura e o assassinato foram praticados em El Salvador por
ditadores instalados e sustentados pelo nosso governo (E.U.A.), um assunto que não suscitou qualquer interesse na opinião pública americana. Para além disso, a história nunca foi realmente contada. No final da década de 1970, entretanto, o governo norte-americano começou a preocupar-se com dois factos. Um era o de que Somoza, o ditador da Nicarágua, estava a perder o controle do país e os Estados Unidos estavam a perder a principal base para os seus exercícios de força na região. Um segundo perigo era talvez o mais ameaçador. Em El Salvador, nos anos de 1970, houve um crescimento das chamadas "organizações populares" - associações camponesas, cooperativas, sindicatos e movimentos eclesiais de base - que se reuniam em torno de grupos de auto- ajuda, etc. Essas movimentações aumentaram a ameaça à democracia e, em fevereiro de 1980, o arcebispo de El Salvador, Don Oscar Romero, enviou uma carta ao presidente Carter em que implorava o não envio de ajuda militar para a junta que governava o país. Ele dizia que tal ajuda seria usada para "estimular a injustiça e a repressão contra organizações populares" que lutavam "pelo respeito dos seus direitos humanos mais elementares" (é desnecessário dizer que isso dificilmente seria notícia em Washington). Poucas semanas depois, o arcebispo Romero foi assassinado enquanto celebrava uma missa. O neonazista Roberto D'Aubuisson foi considerado totalmente responsável pelo assassinato (entre outras incontáveis atrocidades).
D'Aubuisson foi "líder vitalício" do Arena, partido que ainda governa El Salvador; os membros
desse partido, como o ex-presidente Alfredo Cristiani, tinham de fazer um juramento de sangue de lealdade para com ele.

Dez anos depois, milhares de camponeses e pobres da região urbana participaram numa missa
comemorativa, juntamente com inúmeros bispos estrangeiros, mas os Estados Unidos foram
notados pela sua ausência. A Igreja salvadorenha propôs formalmente a canonização de Romero.
Tudo isso se passou com raras referências no país que subvencionou e treinou os assassinos de Dom Romero. O "The New York Times", o "jornal testemunha", não publicou nenhum editorial sobre o assassinato quando ele ocorreu, nem nos anos seguintes, e também nenhum editorial ou reportagem foi feita sobre a comemoração. Em 7 de março de 1980, duas semanas antes do assassinato, foi instituído um estado de sítio em El Salvador, e a guerra contra a população começou com força total (e com o contínuo apoio e envolvimento dos Estados Unidos). O primeiro e principal ataque foi o grande massacre de Rio Sumpul, uma operação militar coordenada pelos exércitos hondurenhos e salvadorenhos, na qual pelo menos seiscentas pessoas foram massacradas. Crianças foram cortadas em pedaços com facões. mulheres foram torturadas e afogadas. Dias depois, partes dos corpos ainda eram encontradas no rio.Havia observadores da Igreja, de modo que as informações saíam imediatamente, mas os principais meios de comunicação não acharam nada que valesse uma reportagem. Os camponeses foram as principais vítimas dessa guerra, ao lado de líderes sindicais, estudantes, padres ou qualquer outro suspeito de trabalhar pelos interesses do povo. No último ano do governo Carter, 1980, o número de mortes chegou a algo em torno de dez mil, aumentando para cerca de
13.000 já sob o comando da era Reagan.

Em outubro de 1980, o novo arcebispo condenou "a guerra de extermínio e genocídio contra a
indefesa população civil", desencadeada pelas forças de segurança. Dois meses depois, estas foram aclamadas pelo seu "heróico serviço ao lado do povo, contra a subversão" pelo "moderado" favorito dos Estados Unidos, José Napoleón Duarte, ao ser nomeado presidente civil da junta.
O papel do "moderado" Duarte era manter a fachada para os dirigentes militares e garantir-lhes a contínua chegada de fundos norte-americanos, mesmo depois de as forças armadas terem violentado e assassinado quatro freiras americanas, o que provocou protestos nos E.U.A.. Trucidar salvadorenhos é uma coisa, porém violentar e matar freiras americanas é definitivamente um erro de relações públicas. Os meios de comunicação de massa evitaram e abafaram a história, seguindo a liderança do governo Carter e a sua comissão de investigação.
Os recém-chegados abutres de Reagan foram mais longe, tratando de justificar a atrocidade, nomeadamente o ministro de Estado Alexander Haig e a embaixatriz das Nações Unidas, Jeane Kirkpatrick. Mas ainda foi considerado se valia a pena ter um julgamento-farsa, enquanto anos mais tarde desculpavam a junta assassina - e naturalmente o seu financiador.

Os jornais independentes de El Salvador, que poderiam ter informado dessas atrocidades, foram
destruídos. Embora eles fossem abertamente a favor das empresas, eram ainda indisciplinados
demais para o gosto dos militares. O problema foi resolvido entre 1980 e 1981, quando o editor de um desses jornais foi morto pelas forças de segurança e outro fugiu para o exílio. Como de
costume, esses acontecimentos foram considerados muito insignificantes para merecer mais que
algumas palavras nos jornais norte-americanos. Em novembro de 1989, seis padres jesuítas, cozinheira e a filha dela foram assassinados pelo Exército. Naquela mesma semana, pelo menos mais 28 civis salvadorenhos também foram mortos, inclusive a dirigente do principal sindicato, a líder de uma organização universitária, nove membros de uma cooperativa agrária indígena e dez estudantes universitários. As agências de notícias transmitiram uma reportagem por intermédio do correspondente da A.P. Douglas Grant Mine, relatando como os soldados entraram num bairro operário, próximo da capital de San Salvador, capturaram seis homens e uma criança de 14 anos, por medida de segurança. Em seguida, colocaram todos contra a parede fuzilaram-nos. "Eles não eram padres nem defensores dos direitos humanos", escreveu Mine, mas, mesmo assim, essas mortes passaram em grande parte despercebidas, assim como a reportagem de Mine. Os jesuítas foram assassinados pelo Batalhão Atlacatl, uma unidade de elite criada, treinada e equipada pelos Estados Unidos. A unidade foi formada em março de 1981, quando 15 especialistas em contra-insurgência, da Escola de Forças Especiais do Exército norte-americano, foram enviados para El Salvador. Desde o início, o Batalhão esteve envolvido no extermínio em massa. Um formador militar norte-americano descreveu os seus soldados como "particularmente ferozes... Nós tivémos sempre dificuldade em conseguir que eles capturassem os prisioneiros em vez das suas orelhas". Em dezembro de 1981, o Batalhão participou numa operação na qual foram mortos mais de mil civis, numa verdadeira orgia de estupros, incêndios e assassinatos. Mais tarde, o Batalhão esteve ainda envolvido em bombardeios de cidades, matança de centenas de civis por fuzilamento, afogamento e outros métodos bárbaros. A grande maioria das vítimas eram mulheres, crianças e velhos. O Batalhão Atlacatl estava a ser treinado pelas Forças Especiais norte-americanas, pouco antes de matar os jesuítas. Esta tem sido a norma em toda a existência do Batalhão. Alguns dos piores ataques ocorreram justamente quando o Batalhão recém-chegara dos E.U.A..

Na "inexperiente democracia" de El Salvador, jovens adolescentes de 13 anos eram capturados em assaltos a favelas e acampamentos de refugiados e, em seguida, forçados a entrar para o Exército, onde eram doutrinados em rituais copiados dos SS nazis, inclusive com brutalização e estupros, preparando-os assim para os extermínios, que frequentemente tinham características sexuais e satânicas. A natureza desse tipo de treino do Exército salvadorenho foi descrita por um desertor, que recebeu asilo no Texas, em 1990. O seu nome foi mantido em sigilo para protegê-lo dos esquadrões da morte salvadorenhos, apesar do pedido do Departamento de Estado para que ele fosse enviado de volta a El Salvador. Segundo esse desertor, os recrutas tinham de matar cães e abutres (não os certos porém...), mordendo-lhes a garganta e torcendo-lhes a cabeça, além de terem de ver os outros soldados torturarem e matarem suspeitos dissidentes, arrancando-lhes as unhas, cortando-lhes a cabeça e partes do corpo. Em seguida,
brincavam com os bocados para se divertirem.
Um outro depoimento, de um membro confesso de um esquadrão da morte ligado ao Batalhão Atlacatl, César Vielman Joya Martínez, deu detalhes do envolvimento dos conselheiros americanos com o governo salvadorenho nas actividades dos esquadrões da morte. O governo Bush fez todos os possíveis para que o calassem e o enviassem de volta para uma provável morte em El Salvador, apesar do apelo das organizações de Direitos Humanos e dos pedidos do Congresso para que o seu testemunho fosse ouvido (o mesmo tratamento foi dado à principal testemunha do assassinato dos jesuítas). Os resultados do treino militar salvadorenho são descritos no periódico jesuíta America por Daniel Santiago, padre católico em missão em EI Salvador. Ele conta a história de uma camponesa que, um dia ao voltar para casa, encontrou os seus três filhos, a sua mãe e a sua irmã sentados à mesa, todos com as cabeças decapitadas, colocadas cuidadosamente em frente aos corpos, com as mãos dispostas para cima "como se estivessem acariciando a própria cabeça". Como os assassinos da Guarda Nacional Salvadorenha tiveram problemas em manter no lugar a cabeça de um bebé, pregaram-na, então, às mãos dele. Depois, um grande balde plástico, cheio de sangue, foi esteticamente exposto no centro da mesa.
Segundo o reverendo Santiago, cenas assim macabras não são raras. “As pessoas não são só assassinadas pelos esquadrões da morte em El Salvador. Elas são decapitadas e as suas cabeças são postas em estacas e exibidas como parte da paisagem. Os homens não são só estripados pela Polícia do Tesouro Salvadorenho; os seus genitais são decepados e colocados dentro da boca da vítima. As mulheres salvadorenhas não são só violadas pela Guarda Nacional, os seus
ventres são cortados e usados para cobrir o rosto. Não basta matar crianças; elas são arrastadas
sobre arames farpados até a carne se soltar dos ossos, enquanto os pais são obrigados a assistir à cena.” O padre Santiago continua a afirmar que violências dessa natureza aumentaram bastante desde que a Igreja começou a formar associações camponesas e grupos de auto-ajuda na tentativa de organizar a população pobre.

De uma forma geral, o nosso projeto em El Salvador tem sido bem-sucedido. As organizações populares foram dizimadas, como havia previsto o arcebispo Romero. Dezenas de milhares de pessoas foram trucidadas e mais de um milhão de salvadorenhos tornaram-se refugiados. Este foi um dos mais sórdidos episódios da história americana - e tem havido muita concorrência.

20 de novembro de 2008

A história das coisas. Até uma criança compreende...


Pareceu-me oportuno, pelo andar da carruagem.

Os principais objectivos da política externa dos Estados Unidos da América VIII. Por Noam Chomsky.

A nossa política de boa vizinhança.




Como os preceitos desenvolvidos por George Kennan foram seguidos? Como deixámos inteiramente de lado a preocupação com os "objectivos vagos e irreais tais como os direitos humanos, a elevação do padrão de vida e a democratização?" Já expus o nosso "compromisso com a democracia”, mas e quanto às outras duas questões? Vamos focalizar a América Latina, e começar olhando para os direitos humanos. Um estudo feito por Lars Schoultz, um destacado académico especialista em direitos humanos da América Latina, mostra que "a ajuda norte-americana tende a ser desproporcionalmente distribuída para os governos "latino-americanos que torturam os seus cidadãos”. Não tem nada a ver com quanto o país precisa de ajuda, somente com a sua disposição em servir à riqueza e ao privilégio. Estudos mais profundos, feitos pelo economista Edward Herman, revelam uma estreita correlação em todo o mundo entre a tortura e a ajuda norte-americana e fornecem uma explicação: ambas se correlacionam com a melhoria das condições de operações das empresas. Em comparação com este guia de princípios morais, assuntos tais como tortura e carnificina caem na insignificância. E a elevação do padrão de vida? Isso foi supostamente tratado na Aliança para o Progresso pelo presidente Kennedy, mas o tipo de desenvolvimento imposto foi direcionado, na sua maior parte, para as necessidades dos investidores norte-americanos. A Aliança fortificou e ampliou o sistema vigente, pelo qual os latino-americanos produzem colheitas para exportação e reduzem as colheitas de subsistência, como milho e feijão, cultivadas para o consumo local. Com o programa da Aliança, por exemplo, a produção de carne aumentou, enquanto o consumo interno de carne diminuiu. Esse modelo agroexportativo de desenvolvimento, em geral, produz um "milagre económico" onde
o PNB - Produto Nacional Bruto - sobe, enquanto a maioria da população morre de fome. Quando
se segue tal orientação política, a oposição popular inevitavelmente aumenta, o que, então, se
reprime com terror e tortura. O uso do terror é profundamente arraigado no nosso carácter. Nos idos de 1818, John Quincy Adams elogiou a "eficácia salutar" do terror em se tratando das "hordas misturadas de índios e negros sem lei". Ele escreveu isso para justificar a violência de Andrew Jackson, na Flórida, que praticamente exterminou a população nativa e deixou a província espanhola sob o controle americano, impressionando muito Thomas Jefferson e outros mais com a sua sabedoria.

O primeiro passo é o uso da polícia; ela é decisiva porque sabe detectar logo o descontentamento e eliminá-lo antes da "grande cirurgia” (como é chamada nos documentos de planeamento) ser
necessária. Se a "grande cirurgia" for necessária, nós contamos com o Exército. Quando já
não conseguimos controlar o Exército dos países da América Latina - particularmente a região do
Caribe e da América Central - é tempo de derrubar o governo! Os países que tentaram inverter as regras, como a Guatemala, sob os governos capitalistas democráticos de Arévalo e Arbenz, ou a República Dominicana, sob o regime capitalista democrático de Bosch, tornaram-se alvo da hostilidade e da violência dos Estados Unidos. O segundo passo é utilizar os militares. Os EUA sempre tentaram estabelecer relações estreitas com os militares de países estrangeiros, porque essa é uma das maneiras de derrubar um governo que saiu fora do controle. Assim foram assentadas as bases para os golpes militares no Chile, em 1973, e na Indonésia, em 1965. Antes desses golpes, éramos bastante hostis aos governos do Chile e da Indonésia, mas continuávamos a enviar armas. Mantenha boas relações com os oficiais certos e eles derrubarão o
governo para si. O mesmo raciocínio motivou o fluxo de armas dos Estados Unidos para o Irão
via Israel, desde o início de 1980. De acordo com altos oficiais israelitas envolvidos, esses factos
eram conhecidos já em 1982, muito antes de haver reféns. Durante o governo Kennedy, a missão dos militares latino-americanos dominados pelos EUA mudou de "defesa hemisférica" para "segurança interna" (que basicamente significa guerra contra a própria população). Essa decisão fatídica implicou a "directa cumplicidade dos Estados Unidos" com "os métodos dos esquadrões de extermínio de Heinrich Himler", no julgamento retrospectivo de Charles Maechling, que foi encarregado do planeamento de contra-insurgência, de 1961 a 1966. O governo Kennedy preparou o caminho para o golpe militar no Brasil em 1964, ajudando a derrubar a democracia brasileira, que se estava a tornar independente demais. Enquanto os Estados Unidos davam entusiasmado apoio ao golpe, os chefes militares instituíam um estado de segurança nacional de estilo neonazista, com repressão, tortura, etc. Isso provocou uma explosão de acontecimentos semelhantes na Argentina, no Chile e em todo o hemisfério, desde os meados de 1960 até 1980 - um período extremamente sangrento.
Eu penso, falando do ponto de vista legal, que há um motivo bem sólido para acusar todos os
presidentes norte-americanos desde a Segunda Guerra Mundial. Eles todos têm sido verdadeiros
criminosos de guerra ou estiveram envolvidos em crimes de guerra. Os militares agem de maneira típica para criar um desastre económico, seguindo frequentemente receitas de conselheiros norte-americanos, e depois decidem entregar os problemas para os civis
administrarem. Um controle militar aberto não é mais necessário, pois já existem novas técnicas
disponíveis, por exemplo, o controle exercido pelo Fundo Monetário Internacional (o qual, assim
como o Banco Mundial, empresta fundos às nações do Terceiro Mundo, a maior parte fornecida em larga escala pelas potências industriais). Em retribuição pelos seus empréstimos, o FMI impõe a "liberalização": uma economia aberta à penetração e ao controle estrangeiros, além de profundos cortes nos serviços públicos em geral para a maior parte da população, etc. Essas medidas colocam o poder decididamente nas mãos das classes dominantes e de investidores estrangeiros (“estabilidade"), além de reforçar as duas clássicas camadas sociais do Terceiro Mundo - a dos super-ricos (mais a classe dos profissionais bem sucedidos que a serve) e a da enorme massa de miseráveis e sofredores.

A dívida e o caos económico deixados pelos militares garantem, de forma geral, que as regras do
FMI serão obedecidas - a menos que as forças populares queiram entrar na arena política. Neste
caso, os militares talvez tenham de reinstalar a "estabilidade". O Brasil é um exemplo esclarecedor desse caso. Sendo um país muito bem dotado de recursos naturais, além de ter um alto desenvolvimento industrial, deveria ser uma das nações mais ricas do mundo. Mas graças, em grande parte, ao golpe de 1964 e ao tão aclamado "milagre económico" que se seguiu ao golpe (sem falar nas torturas, assassinatos e outros instrumentos de "controle da população"), a situação de muitos brasileiros é, agora, provavelmente parecida com a da Etiópia - e bem pior que a da Europa Oriental, por exemplo. O Ministério da Educação informa que mais de um terço do orçamento educacional vai para a alimentação escolar, porque a maioria dos estudantes da rede pública ou come na escola ou não come. De acordo com a revista South (uma revista de reportagens sobre empresas do Terceiro Mundo), o Brasil tem uma taxa de mortalidade infantil maior que a do Sri Lanka. Um terço da população vive abaixo da linha da miséria e "sete milhões de crianças abandonadas pedem esmola, roubam e cheiram cola nas ruas. E para milhares delas a casa é um barraco na favela... ou cada vez mais um pedaço de terra de baixo da ponte”. Assim é o Brasil, um dos países de natureza mais rica do planeta. A situação é semelhante em toda a América Latina. Apenas na América Central o número de pessoas assassinadas pelas forças apoiadas pelos EUA, desde o final de 1970, gira em torno de duzentos mil, ao mesmo tempo que os movimentos populares, que visavam obter a democracia e a reforma social, foram dizimados. Essas façanhas qualificam os Estados Unidos como fonte de “inspiração para o triunfo da democracia no nosso tempo", nas admiráveis palavras da liberal Nova República. Tom Wolfe conta-nos que a década de 1980 foi "um dos grandes momentos de ouro da humanidade, jamais vivido". Como diria Stalin: "estamos deslumbrados com tanto sucesso”...

Os principais objectivos da política externa dos Estados Unidos da América VII. Por Noam Chomsky.

O mundo trilateral.


Desde o começo da década de 1970, o mundo tem tomado um rumo em direcção ao chamado
tripolarismo ou trilateralismo, ou seja, os três maiores blocos económicos que competem entre si. O primeiro bloco é baseado no yen, com o Japão no centro e as antigas colónias japonesas na
periferia. Retrocedendo aos anos 1930 e 1940, o Japão apelidou essa realidade como Grande Esfera da Co-Prosperidade da Ásia Oriental. O conflito com os Estados Unidos nasceu da tentativa de o Japão exercer ali o mesmo tipo de controle que as potências ocidentais exerciam nas suas respectivas esferas. Mas após a guerra nós (EUA) reconstruímos a região para eles. E não tivemos, então, nenhum problema em que oJapão a explorasse - só que agora o Japão teria de explorá-la sob o nosso abrangente poder. Há muitas tolices escritas acerca de como o Japão, de facto, se tornou um grande competidor, que provam que somos honrados e fortalecemos os nossos inimigos. As verdadeiras opções políticas, entretanto, eram mais estreitas. Uma era restaurar o império japonês, mas agora sob o nosso total controle (essa foi a política seguida). A outra opção era ficar fora da região e permitir ao Japão e ao resto da Ásia seguirem caminhos independentes, excluídos da "Grande Área" de controle norte-americano. Isso era impensável. Além disso, depois da Segunda Guerra, o Japão não era considerado como possível concorrente, mesmo num futuro remoto. Especulou-se talvez, a certa altura dos acontecimentos, que o Japão seria capaz de produzir algumas bugigangas, nada mais que isso. Havia uma forte componente de racismo nessa convicção. O Japão recuperou-se em grande parte por causa da Guerra da Coreia e depois com a Guerra do Vietname, que estimulou a produção japonesa e trouxe enormes lucros ao Japão.

Alguns estrategas, logo no início do pós-guerra, foram mais perspicazes, entre eles George
Kennan. Ele propôs que os EUA estimulassem o Japão a industrializar-se, mas com um limite: os EUA controlariam a importação do petróleo japonês. Kennan disse que isso nos daria "poder de veto", se acaso o Japão saísse fora da linha. Os EUA seguiram esse conselho, mantendo o controle do abastecimento e das refinarias de petróleo. Ainda no início da década de 1970, o Japão controlava somente cerca de 10% do seu próprio abastecimento de petróleo. Esse é um dos principais motivos pelo qual os EUA se têm interessado tanto pelo petróleo do Médio Oriente. Não precisávamos do petróleo para nós mesmos; a América do Norte liderava, até 1968, a produção mundial de petróleo. Entretanto, queremos realmente manter as mãos na alavanca
do poder mundial, e assegurar-nos que os lucros fluam principalmente para os Estados Unidos e
para a Inglaterra. É por isso que mantemos bases militares nas Filipinas. Elas são parte de um
sistema global de intervenção apontada para o Oriente Médio, para garantir que as forças locais não sucumbam ao "ultranacionalismo".

O segundo maior bloco competitivo está baseado na Europa e é dominado pela Alemanha, que está dando um grande passo em direção à consolidação do Mercado Comum Europeu. A Europa tem uma economia mais forte que a dos Estados Unidos, além de uma população maior e mais bem instruída. Se um dia ela agir conjuntamente e se tornar um poder integrado, os EUA poderão tornar-se uma potência de segunda classe. Isso é provável com uma Europa dirigida pela Alemanha, tomando a liderança na restauração da Europa Oriental, no seu tradicional papel de colónia económica, basicamente em parte do Terceiro Mundo.

O terceiro bloco é dominado pelos Estados Unidos e baseado no dólar. Foi recentemente ampliado com a inclusão do Canadá, maior parceiro comercial, e logo incluirá o México e outras partes do hemisfério, por meio do "tratado de livre comércio", projectado, em primeiro lugar, para os interesses dos investidores norte-americanos e seus associados. Nós sempre assumimos que a América Latina nos pertence por direito. Como Henry Stimson (secretário de Guerra, sob FDR e Taft, e secretário de Estado de Hoover) uma vez declarou "a nossa regiãozinha, logo ali, que nunca incomodou ninguém". A consolidação do bloco, baseado no dólar, significa que o esforço para frustrar o desenvolvimento independente na América Central e no Caribe vai continuar.
A menos que você entenda as nossas lutas contra os nossos rivais industriais e do Terceiro Mundo, a política externa norte-americana parece ser uma série de erros ocasionais, inconsistentes e confusos. Na verdade, os nossos líderes têm sido mais que bem-sucedidos, dentro dos limites das suas possibilidades, nas tarefas a eles atribuídas.

19 de novembro de 2008

Os principais objectivos da política externa dos Estados Unidos da América VI. Por Noam Chomsky.

A ameaça do bom exemplo.



Nenhum país está isento do tratamento aplicado pelos governos dos EUA, não importa o quão insignificante ele seja. Na verdade, são os países mais fracos e mais pobres que causam as maiores histerias. Veja-se o Laos dos anos 1960, provavelmente o país mais pobre do mundo. A maioria dos seus habitantes nem sabia que tal coisa chamada Laos existia, eles só sabiam que havia uma aldeiazinha aqui e outra acolá mais próxima. Mas assim que uma pequena revolução social começou a aparecer ali, Washington submeteu o Laos a um mortífero "bombardeio secreto" (o autor refere-se aqui logicamente à não-divulgação do facto nos meios de comunicação social locais e internacionais, à época do acontecimento), destruindo virtualmente grandes áreas habitadas com operações que, como foi admitido depois, nada tinham a ver com a guerra que os EUA estavam a travar no Vietname do Sul.

Granada tem cem mil habitantes, que produzem noz-moscada, e mal pode ser encontrada no mapa. Mas quando Granada iniciou uma incipiente revolução social, Washington imediatamente entrou em acção para destruir a ameaça. Desde a Revolução Bolchevique de 1917 até à queda dos governos comunistas do Leste Europeu, no final da década de 1980, era possível justificar qualquer ataque norte-americano como defesa contra a ameaça soviética. Então, quando os Estados Unidos invadiram Granada, em 1983, o presidente do Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas explicou que, na eventualidade de um ataque soviético na Europa Ocidental, uma Granada hostil poderia proibir o abastecimento de petróleo no Caribe para a Europa Ocidental e, então, não poderíamos defender os nossos aliados sitiados. Agora isso parece cómico, mas esse tipo de estória ajuda a mobilizar a opinião pública para apoiar a agressão, o terror e a subversão.

O ataque contra a Nicarágua foi justificado sob a alegação de que, se não os contivéssemos lá,
"eles" poderiam ultrapassar a fronteira de Harlingen, no Texas - apenas a dois dias de carro. Para as pessoas mais instruídas, havia outras desculpas mais sofisticadas e certamente mais plausíveis. A Nicarágua é tão importante para o empresariado americano que ela poderia desaparecer do mapa que ninguém perceberia. A mesma coisa com El Salvador. Mas ambos têm sido submetidos a assaltos homicidas pelos Estados Unidos, com o custo de centenas de milhares de vidas e muitos bilhões de dólares. Há uma razão para isso, o país mais fraco e mais pobre é mais perigoso como exemplo. Se uma nação pequena e pobre como Granada pode ser bem sucedida, alcançando um melhor nível de vida para seu povo, em outro lugar que tenha mais
recursos as pessoas poderão perguntar: "E nós, por que não?"
Esse foi exatamente o caso da Indochina, que é bastante extensa e tem importantíssimos recursos. Embora Eisenhower e seus conselheiros fizessem muito alarde do arroz, do estanho e da borracha, o verdadeiro medo era que, se o povo da Indochina conseguisse independência e justiça, o povo da Tailândia tenderia a imitá-la, e se isso funcionasse, tentaria a Malásia, e em pouco tempo a Indonésia adoptaria a via independente. Até lá, uma significativa parte da "Grande Área" já teria sido perdida. Se se quer um sistema global subordinado às necessidades dos investidores norte-americanos, não se pode deixar que partes do sistema se percam. É notável a clareza com que isso é declarado nos arquivos oficiais - às vezes, até nos arquivos públicos.
Veja-se o Chile no governo de Allende. O Chile é um país consideravelmente grande, com muitos recursos naturais, mas, repetindo, os Estados Unidos não desmoronariam se o Chile se tornasse independente. Por que estávamos então tão preocupados com esse país? Segundo Kissinger, o Chile era um "vírus" que "infectaria" a região, com reflexos até em Itália. Apesar dos quarenta anos de subversão da CIA, a Itália ainda tem um movimento trabalhista. Ter um governo social-democrata bem sucedido no Chile equivaleria a enviar mensagens erradas aos eleitores italianos, por exemplo. Suponha que eles tivessem ideias interessantes sobre como obter o controle do seu próprio país e revivessem os movimentos operários, desmantelados pela CIA na década de 1940. Os estrategas norte-americanos, desde a gestão do secretário de Estado Dean Acheson, no final dos anos 1940, até aos dias de hoje, têm advertido que "uma maçã podre pode estragar o cesto todo". O perigo é que a "podridão" - o desenvolvimento social e económico - pode-se espalhar. Essa "teoria da maçã podre" é chamada de teoria do dominó, para consumo público. A versão usada para amedrontar o povo mostra Ho Chi Min embarcado numa canoa e chegando mais tarde à Califórnia... Talvez alguns líderes norte-americanos acreditassem nessa asneira - é possível -, mas os estrategas racionais certamente que não. Eles entendem que a verdadeira ameaça é o "bom exemplo". Às vezes, a questão é explicada com grande clareza. Quando os EUA estavam a planear derrubar a democracia guatemalteca em 1954, um oficial da Secretaria de Estado declarou que a "Guatemala tem-se tornado uma crescente ameaça para a estabilidade das Honduras e de El Salvador. A sua reforma agrária é uma arma poderosa de propaganda; o seu amplo programa social de ajuda aos trabalhadores e aos camponeses pode resultar numa luta vitoriosa contra as classes dominantes e as grandes empresas estrangeiras. Isso tudo junto significa um forte apelo junto às populações vizinhas da América Central, onde prevalecem condições semelhantes.

Por outras palavras, o que os EUA querem é "estabilidade", quer dizer, segurança para "as classes dominantes e liberdade para as empresas estrangeiras". Se isso pode ser obtido com métodos democráticos formais, tudo bem. Se não, a ameaça à "estabilidade" causada pelo bom exemplo tem de ser destruída, antes que o vírus infecte os outros. É por isso que, mesmo que a mais ínfima partícula cause tal perigo, ela tem de ser esmagada.

Os principais objectivos da política externa dos Estados Unidos da América V. Por Noam Chomsky.

O nosso (dos EUA) compromisso com a democracia.

Com um documento de alto nível atrás do outro, os estrategas norte-americanos expunham a
visão de que a principal ameaça à nova ordem mundial, liderada pelos EUA, era o nacionalismo do Terceiro Mundo - algumas vezes chamado de ultranacionalismo: os "regimes nacionalistas" que atendem às "exigências populares de elevação imediata dos baixos padrões de vida das massas" e produção de bens que satisfaçam as suas necessidades básicas. As metas básicas dos estrategas, insistentemente repetidas, eram evitar que os ultranacionalistas tomassem o poder, e se por um golpe de sorte eles chegassem ao poder, retirá-los e instalar ali governos que favorecessem os investimentos privados do capital interno e externo, a produção para
exportação e o direito de remessa de lucros para fora do país. Essas metas nunca foram contestadas nos documentos secretos. Para um estratega da política norte-americana, essas metas praticamente fazem parte do ar que ele respira.

A oposição à democracia e às reformas sociais nunca é popular no país vítima. Não se consegue
estimular muito as pessoas que aí vivem com isso, excepto um pequeno grupo ligado às empresas norte-americanas, que naturalmente vai lucrar com isso. Os EUA esperam contar com a força e fazer alianças com os militares - "o grupo menos antiamericano da América Latina", como disseram os estrategas de Kennedy -, de modo que se pode confiar neles para esmagar qualquer grupo popular local que saia do controle. Os EUA estão dispostos a tolerar reformas sociais como na Costa Rica, por exemplo, somente quando são eliminados os direitos dos trabalhadores e preservadas as condições para os investimentos estrangeiros. Devido ao governo da Costa Rica ter sempre respeitado esses dois princípios imperativos é que o deixaram seguir com as suas reformas.

Outro problema que é repetidamente apontado nesses documentos secretos é o excessivo
liberalismo dos países do Terceiro Mundo. Esse é particularmente o problema da América Latina,
onde os governos não estão suficientemente comprometidos com o controle de ideias, restrições de viagens e onde o sistema judicial é tão deficiente que exige prova para acusação de crimes.
Essa foi uma das constantes queixas durante o período Kennedy (depois dele, os arquivos não foram mais colocados à disposição do público). Os liberais de Kennedy eram inflexíveis sobre a
necessidade de vencer os excessos democráticos que permitem a "subversão", que para eles, claro, significava pessoas com pensamento errado. Os EUA não primam, no entanto, pela falta de compaixão pelos pobres. Em meados da década de 1950, por exemplo, o nosso embaixador na Costa Rica recomendou que a United Fruit Company, que basicamente governava a Costa Rica, apresentasse "uma ligeira e superficial encenação de interesse humano em relação aos trabalhadores, pois isso poderia ter um grande efeito psicológico". O secretário de Estado John Foster Dulles concordou, dizendo ao presidente Eisenhower que, para manter as massas da América Latina na linha, "há que adulá-las um pouco, para fazê-las pensar que você gosta delas" .
Exposto tudo isso, é fácil entender a política dos EUA para o Terceiro Mundo. Somos radicalmente opostos à democracia se os seus resultados não podem ser controlados. O problema com as democracias verdadeiras é que elas podem fazer os seus governantes caírem na heresia de responderem às necessidades da sua própria população, em vez das dos investidores norte-americanos.

Um estudo do sistema interamericano, publicado pelo Instituto Real de Assuntos Internacionais, em Londres, concluiu que, enquanto os EUA falsamente louvam a democracia, o seu verdadeiro compromisso é com a "empresa capitalista privada". Quando os direitos dos investidores são
ameaçados, a democracia tem de desaparecer; se esses direitos são salvaguardados assassinos e
torturadores são bem-vindos. Governos parlamentaristas foram derrubados com o apoio dos EUA e, algumas vezes, com intervenção directa. No Irão, em 1953; na Guatemala, em 1954 (e em 1963, quando Kennedy apoiou o golpe militar para evitar a ameaça do retorno à democracia); na República Dominicana, em 1963 e 1965; no Brasil, em 1964; no Chile, em 1973, e frequentemente em outros lugares. A nossa política em geral tem sido a mesma, tanto em El Salvador como em outras partes do mundo. Os métodos não são lá muito agradáveis. O que as forças contra-insurgentes americanas fizeram na Nicarágua, ou o que os nossos substitutos terroristas fazem em El Salvador ou na Guatemala, não é apenas matança comum, o principal componente é a tortura brutal e sádica, batendo bebés contra pedras, pendurando mulheres pelos pés, com os seios cortados, a pele do rosto escalpelada, para sangrarem até a morte, ou cortando a cabeça de pessoas, colocando-as em estacas. A questão é esmagar o nacionalismo independente e as forças populares que possam construir uma democracia genuína.

Petição para a demissão da Sinistra Ministra.


Boneco roubado ao Kaos e texto recebido por e-mail.

Caros colegas:

Como sabem, de nada adianta mudar de ministros se não mudar a política da respectiva área.
No entanto, até por uma questão de honra (lembram-se dos "professorzecos"?) e pelo facto de ser impossível ter pior, é bom que seja desta!

Para assinar a petição para a demissão da ministra, aceder aqui:

http://www.petitiononline.com/demissao/

Já vai em 10.656 assinaturas...
Já vai em 12.123 assinaturas (actualizado em 20/11/08)...
A coisa parece que abrandou... 14.556 assinaturas (actualizado em 8/12/08)
23.262 assinaturas (actualizado em 26/1/2009). Mas nunca é tarde...

18 de novembro de 2008

Os principais objectivos da política externa dos Estados Unidos da América IV. Por Noam Chomsky.

A restauração da ordem tradicional.
Os estrategas do mundo pós-guerra, como Kennan, por exemplo, cedo perceberam que ia ser imprescindível, para o bem das empresas americanas , que as outras sociedades ocidentais se refizessem dos prejuízos da guerra, para que pudessem importar mercadorias manufaturadas dos EUA, e assim, fornecerem oportunidades de investimentos. Inclui-se aqui o Japão como parte do Ocidente, seguindo a convenção sul-africana de tratar os japoneses como "brancos honorários". Entretanto, era fundamental que essas sociedades se reconstruíssem de uma maneira bem específica. A ordem tradicional de direita tinha de ser restabelecida, com a dominação das empresas com a divisão e o enfraquecimento dos sindicatos e com o peso da reconstrução a ser colocado inteiramente nos ombros da classe trabalhadora e dos pobres. O principal obstáculo no caminho era a resistência antifascista. Nós, então, reprimimo-la no mundo inteiro e instalámos em seu lugar, na maioria das vezes, fascistas e ex-colaboradores nazistas. Às vezes, isso requeria extrema violência, mas, em outras situações, isso era feito por meio de medidas mais suaves, como subverter eleições ou esconder alimentos extremamente necessários. Este deveria ser o capítulo 1 de qualquer história honesta do período pós-guerra, mas, na verdade, isso raramente é discutido. Esse modelo político foi estabelecido em 1942, quando o presidente Roosevelt colocou o almirante francês Jean Darlan como govemador-geral de toda África do Norte francesa. Darlan era um dos principais colaboradores nazistas e autor de leis anti-semitas, promulgadas no governo de Vichy (o regime fantoche dos nazistas na França). Entretanto, muito mais importante foi o caso primeira área liberada da Europa - o Sul da Itália -onde os EUA, seguindo o conselho de Churchill, impuseram uma ditadura de direita liderada pelo herói de guerra fascista, o marechal de campo Badóglio, e pelo rei Victor Emmanuel III, que também foi um colaborador fascista. Os estrategas norte-americanos reconheceram que a "ameaça" na Europa não era a agressão soviética (que analistas sérios como Dwight Eisenhower não previram), mas a resistência antifascista operária e camponesa com os seus ideais democráticos radicais, o poder político e a atração dos partidos comunistas locais. Para evitar um colapso económico, que aumentaria a influência desses partidos, e para reconstruir as economias capitalistas dos países da Europa Ocidental, os EUA instituíram o Plano Marshall (sob o qual a Europa foi subvencionada em mais de 12 bilhões de dólares, entre 1948 e 1951, com empréstimos e concessões, fundos estes utilizados na compra de um terço das exportações norte americanas para a Europa no auge do ano de 1949. Na Itália, um movimento de base operária e camponesa, liderado pelo Partido Comunista, tinha tomado seis divisões alemães durante a guerra e libertado o Norte da Itália. Quando as forças norte americanas avançaram pela Itália, dispersaram essa resistência antifascista e restauraram a estrutura básica do regime fascista anterior à guerra.

A Itália tinha sido uma das principais áreas de subversão da CIA - Central de Inteligência Americana - desde que a agência foi fundada. A CIA estava preocupada que os comunistas ganhassem o poder nas decisivas eleições italianas de 1948. Muitas técnicas foram utilizadas, inclusive a restauração da polícia fascista, que destruiu sindicatos e escondeu alimentos. Mas, ainda ssim, não estava claro que o Partido Comunista seria derrotado. O primeiro memorando do Conselho de Segurança Nacional (CSNI-1948) especificou uma série de acções que os EUA realizariam se acaso os comunistas vencessem as eleições. Uma das respostas planeadas seria a intervenção armada, com ajuda militar, em operações secretas na Itália. Algumas pessoas, especialmente George Kennan, propuseram acção militar antes das eleições. Ele não queria riscos, mas outros convenceram-no de que poderiam ganhar por meio da subversão, o que se concretizou realmente.

Na Grécia, as tropas britânicas entraram depois dos nazis se terem retirado. Impuseram um regime tão corrupto que provocou nova resistência. Como a Inglaterra, em seu declínio pós-guerra, foi incapaz de manter o controle, em 1947 os Estados Unidos entraram, apoiando uma guerra assassina, que resultou em 160.000 mortes. Foi uma guerra repleta de torturas, exílios políticos de dezenas de milhares de gregos, e aquilo a que chamamos "campos de reeducação" para outras dezenas de milhares de pessoas, destruição de sindicatos e nenhuma possibilidade de independência política. A Grécia foi decididamente colocada nas mãos de investidores americanos e empresários locais, enquanto grande parte da população teve de emigrar para sobreviver. Os beneficiários foram os colaboradores nazistas, e as principais vítimas foram os trabalhadores e os camponeses da resistência antinazista, liderada pelos comunistas. A nossa vitoriosa "defesa" da Grécia contra a sua própria população serviu de modelo para a Guerra do Vietnam - como explicou Adlai Stevenson, na ONU, em 1964. Os conselheiros de Reagan usaram exactamente o mesmo modelo, falando sobre a América Central. E o mesmo padrão foi seguido em muitos outros lugares.

No Japão, o governo de Washington iniciou, em 1947, o chamado "caminho inverso", que reverteu os primeiros passos em direção à democratização empreendida pela administração militar do general MacArthur. O "caminho inverso" reprimiu os sindicatos e outras forças democráticas e colocou o país firmemente nas mãos dos empresários, que haviam apoiado o fascismo japonês - um sistema misto de poder estatal e privado que dura até hoje.

Quando as forças norte-americanas entraram na Coreia, em 1945, dissolveram o governo popular local, composto basicamente de antifascistas, que resistiram aos japoneses. Os EUA inauguraram aí uma repressão brutal, usando a polícia fascista japonesa e coreanos que haviam colaborado com os japoneses durante a ocupação. Cerca de cem mil pessoas foram assassinadas na Coréia do Sul antes daquilo a que chamamos Guerra da Coreia. Inclusive, foram mortas entre trinta e quarenta mil pessoas durante a repressão a uma revolta camponesa, na pequena região da Ilha de Cheju.

O golpe fascista na Colômbia, inspirado pela Espanha de Franco, trouxe pouco protesto do governo norte-americano. A mesma coisa ocorreu com o golpe militar na Venezuela e com a restauração de um admirador do fascismo no Panamá. Mas o primeiro governo democrático da história da Guatemala, inspirado no New Deal de Roosevelt, provocou um amargo antagonismo norte americano. Em 1954, a CIA maquinou um golpe que transformou a Guatemala num inferno na terra. E, desde então, mantém-se assim, com intervenção e apoio regular dos EUA, especialmente durante os governos Kennedy e Johnson. Outro aspecto da repressão à resistência antifascista foi o recrutamento de criminosos de guerra como Klaus Barbie, um oficial da SS de Hitler que tinha sido chefe da Gestapo em Lyon, na França, onde recebeu o apelido de "o talhante de Lyon". Embora ele tivesse sido responsável por crimes hediondos, o Exército dos EUA encarregou-o da espionagem na França. Quando Barbie foi finalmente trazido de volta à França, em 1982, para ser julgado como criminoso de guerra, o seu emprego como agente foi assim explicado pelo coronel (aposentado) Eugene Kolb, orpo de contra-espionagem do Exército americano: "As 'habilidades' [de Barbie] eram um mal necessário... As suas barbaridades tinham sido dirigidas contra o clandestino Partido Comunista e contra a Resistência Francesa", que já eram alvo da repressão dos "libertadores" norte-americanos. Já que os Estados Unidos continuavam onde os nazistas tinham desistido, fazia muito sentido aproveitar os especialistas em atividades anti-resistência. Mais tarde, quando se tornou difícil, ou impossível, proteger esse valioso pessoal na Europa, muitos deles esconderam-se nos Estados Unidos ou na América Latina, muitas vezes com a ajuda do Vaticano e de padres fascistas. Lá, eles tornaram-se conselheiros militares de governos policiais, apoiados pelos Estados Unidos, inspirados, muitas vezes quase abertamente, no Terceiro Reich. Eles também se tornaram traficantes de droga, comerciantes de armas, terroristas e educadores - ensinando a camponeses latino-americanos técnicas de tortura inventadas pela Gestapo. Alguns alunos nazistas fizeram o trabalho de casa na América Central, estabelecendo, deste modo, uma ligação directa entre os campos de extermínio e os esquadrões da morte, tudo graças à aliança pós-guerra entre os EUA e os ex-membros das SS.

Estás mesmo a pedi-las Ção!




17 de novembro de 2008

Princípios fundamentais da Constituição.

"Artigo 9.º(Tarefas fundamentais do Estado).
São tarefas fundamentais do Estado:
a) Garantir a independência nacional e criar as condições políticas, económicas, sociais e culturais que a promovam;
b) Garantir os direitos e liberdades fundamentais e o respeito pelos princípios do Estado de direito democrático;
c) Defender a democracia política, assegurar e incentivar a participação democrática dos cidadãos na resolução dos problemas nacionais;
d) Promover o bem-estar e a qualidade de vida do povo e a igualdade real entre os portugueses, bem como a efectivação dos direitos económicos, sociais, culturais e ambientais, mediante a transformação e modernização das estruturas económicas e sociais;
e) Proteger e valorizar o património cultural do povo português, defender a natureza e o ambiente, preservar os recursos naturais e assegurar um correcto ordenamento do território;
f) Assegurar o ensino e a valorização permanente, defender o uso e promover a difusão internacional da língua portuguesa;
g) Promover o desenvolvimento harmonioso de todo o território nacional, tendo em conta,
designadamente, o carácter ultraperiférico dos arquipélagos dos Açores e da Madeira;
h) Promover a igualdade entre homens e mulheres."
Se a memória fosse curta lá me iria repetir... A respeito de independência nacional já disse aqui o que penso. Quanto ao assegurar e incentivar a participação democrática dos cidadãos na resolução dos problemas nacionais, só podem estar a brincar comigo! Nunca neste país os cidadãos estiveram tão afastados de poderem participar na resolução dos problemas nacionais. Mais, quando têm soluções com algo de útil, pragmático e estrategicamente elaborado, são rapidamente silenciados e negligenciados, se necessário for com artigos de imprensa, que este Governo tão bem sabe controlar, denegrindo a sua imagem e competência. Se é certo que a seguir ao 25 de Abril, alguns mais lentamente do que outros, os partidos esvaziaram os seus quadros de inteligência, de vozes críticas internas, daqueles que poderiam criar um clima progressivo de dialética permanente e de evolução no pensamentos político, actualmente nem de fora dos partidos se consegue uma acção política e intervenção cívica que realmente tenha eco na sociedade civil. Como diz eloquentemente António Barreto no "Público":
«Não sei se Sócrates é fascista. Não me parece, mas, sinceramente, não sei. De qualquer modo, o importante não está aí. O que ele não suporta é a independência dos outros, das pessoas, das organizações, das empresas ou das instituições. Não tolera ser contrariado, nem admite que se pense de modo diferente daquele que organizou com as suas poderosas agências de intoxicação a que chama de comunicação. No seu ideal de vida, todos seriam submetidos ao Regime Disciplinar da Função Pública, revisto e reforçado pelo seu governo. O Primeiro-ministro José Sócrates é a mais séria ameaça contra a liberdade, contra a autonomia das iniciativas privadas e contra a independência pessoal que Portugal conheceu nas últimas três décadas. Temos de reconhecer: tão inquietante quanto esta tendência insaciável para o despotismo e a concentração de poder é a falta de reacção dos cidadãos. A passividade de tanta gente. Será anestesia? Resignação? Acordo? Só se for medo…»

Acerca do teor da alínea d) também já aqui e aqui falei ou, se quiserem, vociferei. O que foi aí referido, e porque estas coisas andam sempre ligadas, só o Governo é que não vê ou não quer ver, também é válido para o ordenamento do território, reflectindo os mapas a concentração desigual de manchas de população, logo de riqueza, de emprego, de oportunidades e de infra-estruturas, pelo território nacional. Mais uma vez, a macrocefalia da região da Grande Lisboa significa atrofia do restante território, com maior e drástica incidência no interior do país. Um país mal estruturado, com regiões desarticuladas entre si e onde o sentido de unidade parece apenas subsistir através de uma língua comum... Neste sentido, o referido na alínea g) encontra-se definitivamente comprometido, não se vislumbrando políticas que o possam inverter. O desenvolvimento harmonioso de todo o território nacional está no caralho! Cabrões de merda!
O espólio de Fernando Pessoa vendido em leilão e o Estado não o compra? Pode atingir 400 mil euros. E então? Não será um artigo de valor incalculável?! Ainda têm dúvidas? Bela defesa do nosso património cultural... A quem só vê cifrões definitivamente não vale a pena acenar com lírica. É como dar pérolas a porcos.

E vejam como se protege a natureza e o ambiente:
- "O Governo aprovou ontem, em Conselho de Ministros, a alteração à delimitação da Reserva Ecológica Nacional (REN) do concelho de Paços de Ferreira, o que permitirá a construção da fábrica Swedwood, da Ikea, projectada para o concelho. (...) Também o Partido Ecologista Os Verdes considera "inadmissível" a posição do Governo. Em comunicado, o partido salienta que "o local se situa junto às linhas de água da serra da Agrela e numa zona florestal composta, entre outras árvores, por sobreiros, espécie de elevado valor ambiental, cultural e económico, o que justifica o especial regime de protecção que a lei lhe consagrava". (...) Helder Spínola (Quercus) frisou que "existiam soluções alternativas, apresentadas pelos concelhos de Estarreja e Paredes, em zonas industriais". Por outro lado, criticou a posição do grupo sueco neste processo: "Uma empresa que diz ter responsabilidade social e ambiental não devia entrar neste tipo de situações."
- "O Tribunal Administrativo de Lisboa suspendeu o loteamento e mandou parar a obra do projecto turístico-imobiliário Costa Terra, no litoral alentejano, na sequência de uma providência cautelar interposta pela Quercus e pelo GEOTA (Grupo de Estudos de Ordenamento do Território e Ambiente), anunciou hoje uma destas associações ambientalistas. De acordo com a Quercus, nesta decisão de primeira instância, passível de recurso, o tribunal decidiu pela “suspensão da eficácia” do despacho conjunto dos ministérios do Ambiente e da Economia que reconhecia a utilidade pública do projecto e permitia o seu avanço na Rede Natura 2000. A decisão do Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa suspende, também, “todos os actos consequentes deste despacho conjunto”, nomeadamente o alvará de loteamento concedido pela Câmara Municipal de Grândola, e determina que a empresa Costa Terra deve “abster-se de realizar qualquer obra no local indicado”, adiantou a Quercus. (...) Como tal, sublinham que “só lhes podem ser reconhecidas [aos projectos] razões imperativas de interesse público invocando a saúde ou a segurança públicas, consequências benéficas primordiais para o ambiente, ou outras razões imperativas de reconhecido interesse público, mediante parecer prévio da Comissão Europeia”.

- "A maioria socialista na Câmara de Vila Franca aprovou a suspensão do Plano Director Municipal (PDM) de Castanheira do Ribatejo nos terrenos onde será instalada a plataforma logística do grupo espanhol Abertis. A necessidade de suspender o PDM tem a ver com o facto de os terrenos em causa estarem classificados como Área Agrícola da Lezíria Norte e Área Agrícola de Policultura afectos às reservas Agrícola Nacional (RAN) e Ecológica Nacional (REN). (...) O vereador da CDU José Francisco Santos sublinhou os “incalculáveis prejuízos” da instalação da plataforma no aluvião do Tejo da Castanheira, uma decisão que conflitua com o Plano Regional de Ordenamento do Território da Área Metropolitana de Lisboa (PROT-AML) que propõe a sua integral preservação. O vereador considerou que o projecto representa um “golpe de morte” para os instrumentos de ordenamento do território, criticou a dispensa de um estudo de impacte ambiental e defendeu que “existem outras alternativas em solos que se encontram destinados à actividade multiusos”.

- "A direcção nacional da Quercus acusa a Estradas de Portugal, Entidade Pública Empresarial, dona da obra do IC9 – sublanço Carregueiros/Tomar (IC3), de estar a avançar ilegalmente com o abate de sobreiros e azinheiras em povoamento no Nó de Carregueiros sem que possua autorização da Direcção-Geral dos Recursos Florestais. A Quercus acusa ainda o primeiro-ministro José Sócrates de ter ignorado os alertas que a Associação Nacional de Conservação da Natureza lhe endereçou, violando assim legislação do Estado Português e da União Europeia.
A Quercus lembra que alertou o primeiro-ministro José Sócrates e os respectivos membros do Governo para o facto das Estradas de Portugal estarem a promover uma obra manifestamente ilegal, mas constata que “os mesmos não impediram o seu avanço, violando uma das suas Resoluções de Conselho de Ministros (RCM n.º 76/2000, de 5 de Julho) e diversa legislação, para além da violação da Decisão da Comissão Europeia de 19 de Julho, a qual é de aplicação directa e obrigatória ao Estado-membro, constituindo esta situação um grave atentado contra o Estado de Direito democrático.”

- "A Polícia Britânica propõe à Procuradoria-Geral da República uma equipa conjunta para investigar os negócios relacionados com o Freeport de Alcochete, avança esta manhã o semanário Sol. A proposta ainda não mereceu resposta por parte de Pinto Monteiro. As autoridades britânicas já enviaram um conjunto de informações bancárias que estão a ser investigadas pelo Ministério Público por suspeitas de corrupção e participação económica em negócio.
A polícia da Grã-Bretanha refere que além dos suspeitos investigados em Portugal, estão em jogo milhões de libras da família real britânica que tinha participações no fundo de investimento accionista do Freeport. Os ingleses adiantam ainda que têm indícios do envolvimento de um político português no caso, mas o jornal Sol não avança nomes.

- "A empresa Portucale, responsável pelo projecto turístico na Herdade da Vargem Fresca, em Benavente, fez pelo menos cinco pedidos para o corte de sobreiros - árvore protegida por lei. E a posição contrária da entidade que tutela as florestas (hoje a Direcção-Geral dos Recursos Florestais) ficou consolidada logo no princípio do processo, há mais de dez anos. (...) Desde o princípio de 2000, houve 13 despachos a declarar a imprescindível utilidade pública de empreendimentos, cuja concretização dependia do corte de sobreiros ou azinheiras (as datas abaixo são as da assinatura dos diplomas). Alguns eram públicos, como estradas, escolas ou habitação social. Outros eram privados, como projectos turístiscos, urbanizações e indústria. O caso da Portucale é o que envolve o corte de mais árvores - mais da metade do total autorizado nos últimos cinco anos. Antes de 2000, houve abates muito maiores. A auto-estrada do Sul (A2), só entre a Marateca e Alcácer do Sal, implicou deitar abaixo 7000 sobreiros. A construção do Alqueva bate todos os recordes: 540 mil azinheiras e 30 mil sobreiros foram sacrificados."
Quanto à igualdade de oportunidades entre homens e mulheres, assinem aqui a petição porra!

Os principais objectivos da política externa dos Estados Unidos da América III. Por Noam Chomsky.

A "Grande Área''.




Durante a Segunda Guerra Mundial, grupos de estudo do Departamento de Estado e do Conselho de Relações Exteriores desenvolveram planos para o mundo pós-guerra nos termos do que eles
determinaram como a "Grande Área", para que esta fosse subordinada às necessidades da economia norte-americana. Estavam incluídos na "Grande Área" o Hemisfério Ocidental, a Europa Ocidental, o Oriente, o antigo Império Britânico (que estava a ser desmantelado), as incomparáveis fontes de energia do Médio Oriente (que estavam a passar então para as mãos americanas ao mesmo tempo que expulsávamos os nossos rivais, França e Inglaterra), o resto do Terceiro Mundo e, se possível, o mundo inteiro. Esses planos foram sendo executados à medida que as oportunidades permitiam.

A cada sector da nova ordem mundial foi designada uma função específica. Os países
industrializados seriam guiados pelas "grandes oficinas", Alemanha e Japão, que tinham
demonstrado as suas proezas na guerra (e agora trabalhavam sob a supervisão norte-americana). Ao Terceiro Mundo cabia “executar a sua principal função de fonte de matérias –primas e de mercado” para as sociedades industriais capitalistas, como dizia um memorando do Departamento de Estado, de 1949. Era para ser “explorado” (nas palavras de Kennan) para a reconstrução da Europa e do Japão. As referências foram feitas ao Sudeste Asiático e a África, mas as questões foram colocadas de modo geral.
Kennan sugeriu até mesmo que a Europa receberia assim um estímulo psicológico com o projeto de “exploração” da África. Naturalmente, ninguém sugeriu que a África explorasse a Europa para a sua reconstrução, melhorando talvez o seu estado de espírito. Esses documentos libertados são lidos somente por estudiosos, que parecem não encontrar nada de estranho ou dissonante em tudo isso.

A Guerra do Vietname emergiu da necessidade de garantir esse papel de serviçal. Os vietnamitas
nacionalistas não quiseram aceitar isso e, portanto, tinham de ser esmagados. A ameaça não era a de que eles pudessem conquistar alguém, mas que eles poderiam dar um exemplo perigoso de
independência nacional, que inspiraria outros países na região. O governo dos EUA tinha de desempenhar dois importantes papéis. O primeiro era o de garantir os distantes domínios da “Grande Área”. Isso exigia uma postura bastante ameaçadora, para assegurar que ninguém interferisse nessa tarefa – motivo pelo qual houve tantas campanhas dirigidas para as
armas nucleares. O segundo papel era conseguir subvenções públicas para a indústria de alta tecnologia. Por vários motivos, o método adoptado tem sido, em grande parte, a aplicação em gastos militares.

Livre comércio é um bom termo para ser utilizado nos departamentos de economia e em editoriais de jornais, mas ninguém do mundo empresarial, nem do governo, leva a sério essa doutrina. Os sectores da economia americana que podem competir internacionalmente são, principalmente, aqueles subvencionados pelo governo: a agricultura intensiva, em termos de capital (a agroempresa, como é chamada), a indústria de alta tecnologia, a indústria farmacêutica, a indústria biotecnológica, etc. O mesmo é válido para outras sociedades industriais. O governo dos EUA faz o povo pagar pela pesquisa e pelo desenvolvimento e proporciona, em grande parte por intermédio dos militares, um mercado garantido para a produção supérflua. Se algo é transacionável, o sector privado encarrega-se dele. O sistema de subsídio público e lucro privado é o que eles chamam de livre empresa.

15 de novembro de 2008

Os principais objectivos da política externa dos Estados Unidos da América II. Por Noam Chomsky.

O extremo-liberal.




O CSN 68 é o extremo da linha dura, e lembre-se: as políticas não eram somente teóricas, muitas delas já estavam realmente a ser implementadas. Agora, vejamos o outro extremo: o grupo denominado "os pombos", onde o principal pombo era, sem dúvida, George Kennan, que dirigiu a equipe de planeamento do Departamento de Estado até 1950, quando foi substituído por Nitze. A propósito, o escritório de Kennan foi responsável pela rede de Gehlen. Kennan era um dos mais inteligentes e lúcidos estrategas dos EUA e uma das mais importantes personalidades na configuração do mundo pós-guerra. Os seus escritos são uma ilustração extremamente interessante da posição dos "pombos". Se alguém quiser realmente conhecer esse país, um documento bom para consultar é o Estudo de Planeamento Político 23, escrito por Kennan
para a equipe de planeamento do Departamento de Estado, em 1948. Eis aqui um exemplo do seu conteúdo:



Nós temos cerca de 50% da riqueza mundial, mas somente 6,3% da sua população... Nesta
situação, não podemos deixar de ser alvo de inveja e ressentimento. A nossa verdadeira tarefa, na próxima fase, é planear um padrão de relações que nos permitirá manter esta posição de
desigualdade... Para agir assim, teremos de dispensar todo o sentimentalismo e devaneio; a nossa atenção deve concentrar-se em toda parte, nos nossos objetivos nacionais imediatos... Precisamos parar de falar de vagos e... irreais objectivos, tais como direitos humanos, elevação do padrão de vida e democratização. Não está longe o dia em que teremos de lidar com conceitos de poder directo. Então, quanto menos impedidos formos por slogans idealistas, melhor.
O EPP 23 era, logicamente, um documento altamente secreto. Para pacificar o povo, era necessário difundir "slogans idealistas" (como ainda é constantemente feito), mas aqui os estrategas falavam entre si.
Seguindo essas mesmas linhas, numa reunião de embaixadores americanos na América Latina, em 1950, Kennan observou que a maior preocupação da política externa norte-americana deve ser "a proteção das nossas (isto é, da América Latina) matérias-primas". Devemos, portanto, combater a perigosa heresia que, segundo informava a Inteligência americana, estava a espalhar-se pela América Latina: "A ideia de que o governo tem responsabilidade directa pelo bem do povo".
Os estrategas americanos chamam a essa ideia comunismo, seja qual for a real opinião das
pessoas que a defendem. Elas podem formar grupos de auto-ajuda, baseados na Igreja, ou quaisquer outros, mas se elas apoiam tal heresia, elas são comunistas.
Essa posição é também clara nos arquivos públicos. Por exemplo, um grupo de estudos de alto nível declarou, em 1955, que a ameaça principal das potências comunistas (o verdadeiro sentido do termo comunismo na prática) é a recusa em exercer o seu papel serviçal, isto é, o de "complementar as economias industriais do Ocidente".
Kennan seguiu explicando os meios que devíamos utilizar contra os inimigos que caíam nessa
heresia: A resposta final pode ser desagradável, mas... não devemos hesitar diante da repressão policial do governo local. Isso não é vergonhoso, porque os comunistas são essencialmente traidores... É melhor ter um regime forte no poder do que um governo liberal, indulgente, brando e infiltrado de comunistas.

Tais políticas não começaram com liberais pós-guerra como Kennan. Há trinta anos, o secretário de Estado Woodrow Wilson já havia declarado que o significado prático da Doutrina Monroe levava em conta que "os Estados Unidos consideram os seus próprios interesses. A integridade das outras nações americanas é um mero acidente, não um fim". Wilson, o grande apóstolo da
autodeterminação, concordou que o argumento era "irrefutável", embora fosse "apolítico"
apresentá-lo publicamente. Wilson agiu de acordo com esse pensamento ao invadir, entre outras coisas, o Haiti e a República Dominicana, onde os seus soldados assassinaram, destruíram e demoliram o sistema político vigente, deixando as empresas norte-americanas firmemente no controle e preparando, assim, o cenário para ditaduras brutais e corruptas.

Jeremias o fora-da-lei.


Vou falar-vos dum curioso personagem: Jeremias, o fora-da-lei
Descendente por linha travessa do famigerado Zé do Telhado
Jeremias dedicou-se desde tenra idade ao fabrico da bomba caseira
Cuja eloquência sempre o deixou maravilhado
Para Jeremias nada se assemelha à magia da dinamite
A não ser talvez o rugir apaixonado das mais profundas entranhas da terra
E só quando as fachadas dos edifícios públicos explodirem numa gargalhada
Será realmente pública a lei que as leis encerram
Há quem veja em Jeremias apenas mais uma vítima da sociedade
Muito embora ele tenha a esse respeito uma opinião bem particular
É que enquanto um criminoso tem uma certa tendência natural para ser vitimado
Jeremias nunca encontrou razões para se culpar
Porque nunca foi a ambição, nem a vingança, que o levou a desprezar a lei
E jamais lhe passou pela cabeça tentar alterar a Constituição
Como um poeta ele desarranja o pesadelo para lá dos limites legais
Foragido por amor ao que é belo e por vocação
Jeremias gosta do guarda roupa negro e dos mitos do fora-da-lei
Gosta do calor da aguardente e de seguir remando contra a maré
Gosta da forma como os homens respeitáveis se engasgam quando falam dele
E da forma como as mulheres murmuram: fora-da-lei
Gosta de tesouros e mapas sobretudo daqueles que o tempo mais maltratou
Gosta de brincar com o destino e nem o próprio inferno o apavora
Não estando disposto a esperar que a humanidade venha alguma vez a ser melhor
Jeremias escolheu o seu lugar do lado de fora
Jeremias escolheu o seu lugar do lado de fora



Jorge Palma, álbum "O Lado Errado da Noite".

Já agora fica aqui a ligação para o óptimo site deste Grande Senhor.

Esta também vem bem a propósito!



Atenção pá que a luta não é para todos!

"A principal diferença, entre a avaliação dos professores e a avaliação dos restantes funcionários, não reside somente na nomeação dos notadores e na definição dos objectivos, como aliás seria de esperar? Não é o sistema de avaliação da generalidade dos funcionários públicos, muito semelhante ao sistema de avaliação dos professores? Então porque não há contestação pública dos outros funcionários ao sistema de avaliação?
Será que, para os outros funcionários, o novo sistema é mais justo e garante dos seus direitos?
Será que os outros funcionários, são menos esclarecidos ou menos dignos do que os professores?
Será que os outros funcionários estão mais acomodados à prepotência da administração pública, ou têm outras formas de se proteger?
Será que os outros funcionários usam lealdades e subserviências corporativas, do antigamente? Que fazem um comércio de favores de todo o género?
Será que se vendem a troco de alguma frágil segurança no emprego?
Será que, após dois ou três anos em vigor, os sindicatos consideram que este sistema deu boas provas, que é justo, e que não tem falhas dignas de nota, que não é uma prioridade sindical?
Será que há algum "memorando de entendimento" com os ministérios, que impede os sindicatos de levantar a voz em defesa dos outros funcionários publicos, não professores?Porque não se junta a voz dos outros funcionários, à voz dos professores?

15 Novembro, 2008 16:17"

Fica a pergunta... Comentário copiado do Mais Évora acerca da efectiva contestação dos professores ao modelo de avaliação imposto.