Um dos bons investimentos públicos para animar a economia foi a ideia de renovar o parque escolar. Não se tratando de criar elefantes brancos e tendo uma utilidade evidente para o nosso desenvolvimento a medida permitia pôr centenas de empresas a trabalhar por esse país fora. Criando emprego de forma transversal - do mais ao menos qualificado - e estando espalhado por todo o País, contrariando assim a concentração dos grandes investimentos no litoral, este é o tipo de investimento público com efeitos reprodutivos imediatos. Um excelente exemplo para outras experiências. Ao visitar novas escolas percebemos que, independentemente de algumas falhas de construção e planeamento, o salto nas condições de trabalho para estudantes e professores é abissal. É dinheiro bem empregue que ajuda a vencer a crise melhorando consistentemente a qualidade de vida dos cidadãos. Mas se a recuperação das escolas parece estar a correr bem, os seus efeitos económicos adivinham-se pouco relevantes. Infelizmente, os casos de compadrio na contratação de vários serviços por parte da empresa Parque Escolar têm sido mais do que muitos e têm surgido com frequência na comunicação social. Mesmo o que não corresponde a qualquer suspeita de ilegalidade passou pelo ajuste directo garantindo que o dinheiro vai para os ateliers e construtoras do costume. Como sempre, o País vive entre a burocratização absurda e desnecessária e o atalho do ajuste directo que afecta a transparência do Estado. Com este exemplo percebemos onde falha o País. Uma boa medida política para a recuperação económica perde grande parte da sua eficácia quando chega ao terreno. Porque das elites políticas (as de topo e as intermédias) às elites económicas e culturais, quase todos parecem viver de uma boa agenda de contactos no Estado, apropriando-se assim dos parcos recursos financeiros públicos. No fim, o dinheiro que se perdeu no caminho, as perversões à concorrência que se reforçaram e os vícios que se confirmam na relação entre os privados e o Estado tornam inúteis todas as boas intenções. O debate sobre a corrupção, o compadrio ou a simples falta de transparência na utilização dos dinheiros públicos presta-se a todos os populismos. Mas ele é o nó górdio de muitos dos problemas estruturais deste País. Tudo isto terá origens culturais, mas isso não é o mais relevante. A verdade é que todas as sociedades desiguais têm Estados pouco transparentes. Porque se a desigualdade também se mede no acesso aos recursos públicos, é natural que sejam os mesmos de sempre a garantir para si o que devia ser de nós todos para assim perpetuarem a desigualdade de que se alimentam. Combater o nosso atraso passa por impor a transparência nos procedimentos. O que tem de ser simples deve ser simples. O que tem de ter regras apertadas deve ser fiscalizado. Em Portugal é ao contrário: qualquer pequeno gesto de um cidadão ou de uma empresa, por mais irrelevante que seja, tem de passar por um labirinto infernal de burocracia. Já os bons negócios com o Estado seguem por atalhos sem controlo de ninguém. Sem mudar isto, excelentes ideias como a recuperação do parque escolar acabarão sempre por ficar muito longe do que podiam ser. Foi assim com os dinheiros europeus para formação profissional, com os milhões gastos em obras públicas ou com os apoios comunitários à agricultura. E o problema é que se começam a esgotar as oportunidades para quebrar este ciclo vicioso.
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