16 de novembro de 2010

O buraco conjuntural e o buracão estrutural. Por Nuno Garoupa.

Portugal está metido num grande buraco. Diga-se em abono da verdade que há seis meses ainda a nossa classe política, com destaque para o sempre optimista primeiro-ministro, negava o abismo em que caímos. Agora pelo menos todos concordam que estamos mesmo num lodaçal imenso. O buraco português é economicamente conjuntural e estrutural. Conjunturalmente trata-se de um problema de financiamento. Devemos muito dinheiro ao exterior. Necessitamos que o exterior continue a financiar-nos para que os portugueses possam comer. Tudo o que o PS e o PSD fizeram até agora em termos de medidas duríssimas foi para tentar sair do buraco conjuntural sem chamar o FMI e o Fundo Europeu de Estabilidade. Contudo, se os juros da dívida continuarem a subir, parece menos provável que Portugal possa sair do buraco conjuntural sem o FMI. Mas nem o Orçamento de 2011, com ou sem um futuro PEC IV, nem o FMI vão resolver o buraco estrutural. A economia portuguesa estará, no melhor cenário possível, estagnada até 2020. Sem competitividade. Sem crescimento. Sem desenvolvimento. Andam por aí umas almas socialistas a falar que estaremos já em recuperação em 2012 ou 2013. Mentem. Não é optimismo, é mentira pura e dura. Portugal só pode sair do buraco estrutural depois de mudar muita coisa na economia e na sociedade. Ora nada mudou desde 2005. O actual Governo não fez nenhuma reforma estrutural. A maioria absoluta de 2005-2009 viveu da propaganda de um reformismo que nunca jamais foi realidade. Mas sejamos sinceros. Sócrates não fez as reformas que a economia portuguesa exigia porque os portugueses, na sua ampla maioria, não querem mudar nada. O pouco que se tentou fazer na educação, na saúde, na justiça ou na administração pública foi recusado pelos portugueses, foi criticado de forma irresponsável e demagógica pela direita, e evidentemente levou o PS ao eleitoralismo barato para ganhar as eleições em Setembro de 2009. Para sair do buracão estrutural em que Portugal está metido muito tem que mudar no sistema político. Chegámos aqui porque o PS e o PSD governaram o país de forma facilista, eleitoralista, a alimentar clientelas partidárias, a pensar menos no longo prazo e mais na perpetuidade do poder. Começou com Cavaco (por mais que a direita ache sempre que a desgraça foram só os quinze anos de socialismo), foi a demagogia irresponsável do "guterrismo", a incompetência de Durão e Portas, acabando nas loucuras do PS actual. Politicamente temos também um buraco conjuntural e um buracão estrutural. Conjunturalmente, é evidente que Portugal não pode sair do buraco com Sócrates que, nos últimos doze meses, demonstrou um grau de irresponsabilidade e incompetência que o deixou sem credibilidade interna e externa. Mas a saída do actual primeiro-ministro não soluciona o buracão estrutural. Se os partidos políticos fossem realmente sérios, se o actual regime democrático não estivesse totalmente capturado e dominado pelos interesses corporativos instalados, se a comunicação social fosse realmente crítica e fizesse o trabalho de casa, se a sociedade civil existisse e fosse activa, nas próximas eleições legislativas teríamos os candidatos a primeiro-ministro a responder quantos funcionários públicos vão ser afastados (cem mil? duzentos mil?); quantas escolas, hospitais, universidades e tribunais vão ser fechados; quantos institutos públicos, fundações, empresas públicas vão ser encerradas (cem? duzentos? trezentos?); quantos munícipios vão ser fundidos (dos 308, quantos precisamos? cem? cento e cinquenta?); quantas freguesias vão ser eliminadas (das 4.260, quantas precisamos? quinhentas? mil?). Evidentemente que sabemos o que o PS vai dizer, com ou sem Sócrates. Reforma da administração pública sem despedir funcionários, com introdução do mérito, mas sem prejudicar ninguém. Reforma do Estado Social sem fechar escolas, universidades e hospitais. Reforma da justiça sem fechar tribunais, com mais magistrados e mais recursos financeiros. Reforma do sistema político sem mexer na Constituição política, sem tocar no monopólio dos partidos, sem eliminar municípios e freguesias (talvez até com a regionalização), sem efectivamente combater a corrupção, mantendo os "boys" e as "girls" contentes, etc. Veremos a seu tempo se o PSD e o CDS fazem a diferença. Se fizerem o mesmo discurso que o PS, o mesmo discurso que fizeram nas eleições de 2009, em nome de uma pura táctica eleitoralista, então com o actual regime político, Portugal simplesmente não tem futuro. Não agora. Não em 2020. É bem possível que o discurso facilitista do PS, apoiado no partidarismo clientelar do Bloco Central, continue a governar Portugal por muitos anos com o voto absolutamente democrático de tantos portugueses. Afinal, o peronismo arruinou a Argentina de forma definitiva e lá continua no poder.

Artigo aqui.

Ora aí está a análise de alguém que pode ver o seu próprio país a alguma distância (Professor de Direito da University of Illinois), o que lhe conferirá uma melhor perspectiva, e que parece não estar comprometido, como os fala-barato do costume, com nenhuma força política. Assusta, não assusta? Ah pois é!

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