3 de junho de 2009

"Desenhando o Futuro" por Jacque Fresco. Sexto Capítulo.

A Energia.

Um dos mais úteis padrões de aferição do grau de desenvolvimento de uma civilização é a quantidade de energia disponível por pessoa. Em larga medida, o grau de conforto físico de que dispomos hoje está directamente relacionado com a quantidade de energia à nossa disposição. Imagina a paralisação que ocorreria se o teu fornecimento de electricidade e gasolina fossem interrompidos e se tivesses de usar os teus próprios músculos para realizar todas as tarefas facilitadas por essas fontes de energia.

A economia baseada nos recursos disponíveis trabalharia de imediato com fontes de energia limpa, o que apenas se torna possível quando terminarem as limitações monetárias na forma como conseguimos fornecer aquilo que é necessário à sobrevivência. Com as restrições do lucro, da propriedade e da escassez eliminadas, os laboratórios de pesquisa rapidamente começariam a trabalhar em conjunto, trocando informações de forma completamente livre. Deixaria de existir a necessidade de registar patentes ou proteger informação, porque o objectivo final não seria realizar dinheiro para continuar a trabalhar em prol do lucro, mas sim alcançar resultados que pudessem rápida e livremente estar disponíveis para melhorar a vida de toda a população do planeta.

Este é um projecto em que muita gente estaria ansiosa e grata por participar, a partir do momento em que servisse para benefício imediato de todos e não apenas de determinada empresa ou corporação. Equipas interdisciplinares de pessoal qualificado, alinhadas com as intenções do projecto, iriam trabalhar na produção de energia e nos sistemas automatizados para produzir e fornecer bens e serviços numa escala massiva. Até os estudantes universitários poderiam participar na obtenção de métodos que permitissem resolver estes problemas de base.

Estes podem na verdade ser os exércitos do futuro. Uma vasta e pacífica mobilização de gente apostada em preservar a Terra e a sua população, algo que nunca foi feito antes na história da humanidade e que apenas poderá ser real quando o dinheiro não constituir já um obstáculo. A questão deixa de ter a ver com o dinheiro disponível para execução do projecto, para passar a centrar-se na disponibilidade de recursos para atingir esta nova direcção, este rumo inovador de fraternidade entre os homens.

Durante o período de transição de um sistema para o outro, as regiões com problemas de escassez serão munidas com acumuladores de calor para cozinhar e esterilizar água e os alimentos serão desidratados e comprimidos para se diminuir o volume da carga e tornar o seu transporte mais sustentável. As embalagens serão bio-degradáveis e poderão ser utilizadas como fertilizantes que não contaminam o solo. As regiões desprovidas de solo arável utilizarão quintas hidropónicas (agricultura sem solo em que as plantas são alimentadas somente com água e os componentes minerais necessários ao seu desenvolvimento) e pisciculturas, tanto terrestres como marítimas. Para que seja possível preservar energia durante a transição, as refeições serão distribuídas através de centros de confecção e distribuição, directamente para as casas e restaurantes, ao invés de serem preparadas por cada família independentemente. Estes métodos massivos de fornecer bens e serviços serão aplicados pelo mundo fora nos mesmos moldes.

Vastas fontes de energia serão exploradas e desenvolvidas, o que incluirá o aproveitamento do vento, ondas e marés do mar, correntes oceânicas, amplitudes térmicas, cascatas naturais, energia geotérmica, electroestática, do hidrogénio, gás natural, algas, bio-massa, bactérias exotérmicas e energia termo-iónica (obtida pela conversão de calor em electricidade através da passagem de electrões estimulados pelo calor que depois se condensam numa superfície fria). Teremos ainda a possibilidade de utilizar o potencial das lentes de Fresnel para concentrar calor.

A energia de fusão, outra fonte imensa e renovável de energia, é a mesma energia que move o cosmos e as estrelas e, quando descobrirmos a forma de a controlar e canalizar, os problemas mundiais energéticos serão solucionados para sempre, sem que para isso sejam produzidos quaisquer resíduos tóxicos perigosos. O único resíduo será apenas a cinza limpa do hélio.
Ao longo do século XX já os oceanógrafos nos diziam que se conseguíssemos aproveitar a vasta energia potencial dos oceanos do planeta, que ocupam 70,8% da superfície da Terra, facilmente poderíamos encontrar a solução para as presentes e futuras necessidades de energia com um prazo de milhões de anos assegurado.

Um elemento chave no projecto das cidades da economia baseada nos recursos é a inclusão do aproveitamento e produção de toda a energia necessária na estrutura da própria cidade, o que será mais detalhadamente explicado adiante na secção Cidade.

Outra imensa fonte de energia inexplorada encontra-se no desenvolvimento de materiais piezoeléctricos, ou sistemas laminados no interior de cilindros, que são activados para a produção de energia através da subida e descida das marés oceânicas.

A energia geotérmica, extraída do calor interno da Terra, encontra-se já em utilização um pouco por todo o mundo com tremendo sucesso de aplicação, de tal forma que os cientistas envolvidos estimam que se desenvolvermos e canalizarmos apenas 1% da energia geotérmica existente na crosta da Terra, conseguiremos eliminar os nossos problemas energéticos. Com o fim das restrições monetárias inerente à economia baseada nos recursos, toda a população mundial teria a possibilidade de confirmar as afirmações desses cientistas.

Por outro lado, a energia geotérmica pode fornecer mais de 500 vezes a energia contida em todas as jazidas mundiais de petróleo, ao mesmo tempo que reduz a ameaça do aquecimento global provocado pela queima desse combustíveis fósseis. As centrais de energia geotérmica produzem assim muito pouca poluição quando comparadas com as centrais que funcionam pela queima de combustíveis fósseis e não emitem óxido de nitrogénio ou dióxido de carbono, sendo apenas necessária uma relativa pequena porção de solo para instalação da central de produção. Sem uma economia monetária controlada pelas companhias de petróleo e de gás natural, a energia geotérmica tornar-se-ia a forma mais fácil e eficiente de aquecer e arrefecer edifícios. Mas o mais impressionante é que se aplicássemos apenas um décimo da quantia que é gasta actualmente em equipamento militar no desenvolvimento de geradores geotérmicos, há muito que poderíamos ter resolvido os nossos problemas energéticos a nível mundial.

Em zonas inóspitas mas habitadas como a Islândia, a energia geotérmica é utilizada para cultivar plantas todo o ano em estufas criadas para o efeito. Na economia baseada nos recursos e usando este método, enormes quantidades de vegetais frescos poderiam ser produzidas em todas as estações, independentemente das condições atmosféricas. Um processo similar pode ser aplicado às pisciculturas, por exemplo, e também em regiões onde é necessário o aquecimento e arrefecimento de edifícios. No mar, estruturas submarinas adequadas poderiam aproveitar uma parte substancial das correntes profundas, conduzindo-as a turbinas de grandes dimensões e gerando deste modo energia eléctrica perfeitamente limpa do ponto de vista ambiental. Para prevenir qualquer perigo para a vida marinha, as turbinas seriam simplesmente equipadas com um separador centrífugo e deflectores, impedindo assim a morte de qualquer espécie.

Uma ponte terrestre, servindo simultaneamente de barragem, ou um túnel através do Estreito de Bering, entre a Ásia e a América do Norte, poderia gerar energia eléctrica, para além da possibilidade de recolher e processar produtos marinhos, num circuito de aproveitamento alimentar. Por baixo e por cima da superfície do oceano haveria túneis para o transporte de passageiros e carga e condutas possantes poderiam canalizar água fresca dos icebergs em fusão para outras partes do mundo. Esta estrutura de grande dimensão possibilitaria não só uma ligação física entre continentes, mas também um grande ponto de encontro para trocas sociais e culturais.

Na nossa economia baseada nos recursos há estudos exaustivos acerca dos impactos ambientais e humanos antecedendo o início de cada projecto de grande dimensão, uma vez que a maior preocupação é proteger e restaurar o ambiente terrestre para benefício de todas as criaturas vivas na grande comunidade da vida. O propósito último da construção e desenvolvimento destes projectos alternativos de produção de energia é o de libertar os seres humanos de trabalhosas tarefas desnecessárias porque, para que se consiga atingir esta sociedade conforme aqui vai sendo descrita, necessitaremos de automatizar a maior parte dos actuais postos de trabalho e o mais cedo possível.

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