9 de junho de 2011

Uma boa reflexão de Marinho Pinto sobre a corrupção em Portugal.

A corrupção constitui hoje a principal causa da degenerescência da democracia portuguesa e é um dos mais sérios entraves ao nosso desenvolvimento. Na sua dimensão mais nociva, ela traduz-se no facto de os agentes públicos (funcionários, magistrados e titulares de órgãos políticos) praticarem actos contrários aos seus deveres funcionais em troca de subornos, que tanto podem ser materializados em dinheiro (comissões), como em empregos ou outras vantagens. Ela ocorre sobretudo na adjudicação de obras públicas, em licenciamentos ou concessões e na aquisição de bens ou serviços por parte do estado, incluindo empresas públicas e administração local.
A sua danosidade evidencia-se, desde logo, na circunstância de as melhores decisões, em termos de interesse público, serem preteridas em favor das que mais vantagens proporcionam ao decisor ou a terceiros: familiares, partidos políticos, clubes de futebol, etc. A corrupção distorce também as regras do mercado, fazendo com que as empresas que mais prosperam já não sejam as melhores, isto é, as que são bem geridas e que apresentam produtos ou serviços com mais qualidade, mas sim aquelas que proporcionam (mais) vantagens aos decisores públicos. A situação chegou a tal ponto que Daniel Kaufmann, um alto dirigente do Banco Mundial, afirmava em 2005 que Portugal podia estar ao nível do desenvolvimento da Finlândia se a corrupção fosse combatida com mais eficácia.
Mas, a pior consequência da corrupção é, indubitavelmente, a anomia da sociedade perante os sinais que a evidenciam, como se ela, apesar da sua perversidade, fosse uma inevitabilidade. É essa espécie de encolher de ombros colectivo que permite que ela se expanda ostensivamente. Corruptos e corruptores sentem-se cada vez mais impunes, pois sabem que não serão sancionados, nem através do voto democrático.
Pessoas houve que fizeram fortunas no exercício das mais altas funções do Estado, incluindo os funções de governo, durante anos, à vista de todos, sem que ninguém se incomodasse com isso e sem a mais leve sanção moral ou política.
Nenhuma obra pública em Portugal é paga pelo preço por que foi adjudicada. O seu custo final é sempre superior ao preço contratualizado, chegando a ultrapassá-lo em, duas, três, quatro ou mais vezes, sem que ninguém seja responsabilizado por isso.
O país está na ruína financeira mas comprou a uma empresa da Alemanha dois submarinos por mil milhões de euros. As autoridades alemãs processaram o consórcio vendedor porque descobriram que ele pagou dezenas de milhões de euros em subornos para ser preferido pelo comprador. Porém, em Portugal todos (políticos, polícias, magistrados e jornalistas) assobiam para o lado e ninguém quer saber quem recebeu esse dinheiro. O Estado português pagou trinta milhões de euros a mais, mas ainda ninguém deu uma explicação para isso nem se sabe aonde foi parar esse dinheiro.
Em Coimbra, um prédio de uma empresa pública é vendido às 10 horas da manhã por cerca de 15 milhões de euros e às 3 da tarde é revendido por cerca de 20 milhões. A empresa que intermediou o negócio e abiscoitou esse lucro tinha como consultores remunerados o presidente da Comissão Política Concelhia do PS e o presidente da Comissão Política Concelhia do PSD. Nenhum deles foi importunado nem as direcções nacionais dos seus partidos se interessaram pelo assunto.
Um governo em gestão autorizou, por despacho de três ministros, em vésperas de ser substituído, um empreendimento urbanístico numa zona ecológica. Nesse mesmo dia foram arrancados cerca de mil sobreiros que é uma árvore protegida. Alguns dias depois, o partido a que pertenciam dois dos ministros que assinaram o despacho (por sinal o mesmo do ministro da Defesa que comprara os submarinos), recebeu um milhão de euros em dinheiro vivo, depositado na sua conta com nomes falsos, em tranches de 10.000 euros (que é a quantia máxima que a lei permite depositar sem necessidade de justificar a origem). O escândalo foi tal que o Ministério Público abriu um processo e constituiu arguidos esses ministros, mas sem consequências. Alguns deles até foram «desarguidos» antes de concluído o inquérito. Só faltou pedir-lhes desculpas pelo incómodo. Nunca ninguém quis apurar, sequer, a(s) identidade(s) de quem fez tão generosa doação.
Mesmo alguns dirigentes políticos que, em dado momento, mais ergueram a voz contra a corrupção, aparentando querer combatê-la realmente, acabaram eles próprios «subornados» com a oferta de bons empregos e... Obviamente, desapareceram.
Enfim, Portugal é isto!



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