7 de julho de 2010

"Desenhando o Futuro" por Jacque Fresco. Décimo Primeiro Capítulo.

Estilos de Vida.
O Que Fazem as Pessoas?


Desde as primeiras civilizações humanas até aos dias de hoje a maior parte dos seres humanos foram forçados a trabalhar para conseguirem sobreviver na sociedade. Muitas das nossas atitudes perante o trabalho derivam precisamente do excesso que representava o trabalho nesses tempos primordiais. No passado era imperioso que a população transportasse a sua própria água até à residência para consumo diário. Deviam também recolher e transportar a madeira essencial para aquecimento e cozinhar e preparar combustível adequado para iluminação doméstica. Teria sido muito difícil para eles imaginar uma época em que a água brotasse directamente nas suas casas com o rodar de uma torneira e, obter luz imediatamente premindo um simples botão teria parecido algo do domínio da magia. As pessoas desses tempos antigos teriam já provavelmente imaginado o que poderiam fazer com o seu tempo livre se não tivessem de executar tarefas tão demoradas, e por vezes pesadas, essenciais à altura para manter e sustentar as suas vidas.

Aliviando as Pressões Humanas.

Seres humanos livres de dívidas, insegurança e medos tornam-se inevitavelmente pessoas mais amáveis e amistosas. Se não existir mais ninguém para vender o que quer que seja a quem quer que seja ou para privar alguém de bens e dinheiro, as bases para pérfida agressão e disputa humanas estão erradicadas. As pessoas deixarão de estar sobrecarregadas com enervantes preocupações, que tanto tempo consomem nas suas vidas, como hipotecas, empréstimos, custos de cuidados médicos, propinas da educação dos filhos, seguros de incêndio, da casa e do automóvel, recessões ou depressões económicas, perder o emprego e, os impostos. Com a eliminação destes fardos permanentes impostos na vida do cidadão comum e o desaparecimento das condições sociais que promovem a inveja, a ganância e a competição desmesurada, as vidas das pessoas têm finalmente condições para se tornarem de longe mais significantes e com verdadeiro sentido humano.

O objectivo deste novo projecto social é encorajar um também novo sistema de incentivos que não esteja direccionado para os superficiais e egocêntricos objectivos da acumulação de riqueza, propriedade e poder. Estes novos incentivos impulsionam as pessoas na direcção da realização pessoal e da criatividade, da eliminação da escassez, da protecção do ambiente e, acima de tudo, para a real preocupação com o seu semelhante humano. As pessoas teriam os meios e o tempo necessários para empreenderem o seu crescimento intelectual e espiritual e o ambiente propício para se mentalizarem do que realmente significa ser humano numa sociedade inclusiva e que se preocupa com os demais. Ao invés de evoluírem simplesmente para uma época de puro lazer, as pessoas verdadeiramente inteligentes e empenhadas teriam no fundo pouco tempo livre, mesmo não tendo a obrigação de trabalhar para poder viver, ou sobreviver. A necessidade de melhores e mais eficientes maneiras de fazer as coisas é permanente e isso levaria as pessoas a quererem participar na sociedade, observando como isso pode directamente beneficiar o seu modo de vida e dos seus semelhantes, à medida que os processos são constantemente alterados e melhorados. Não há aqui qualquer utopia. A própria noção de utopia é estática. A sobrevivência de qualquer sistema social depende em última instância da sua capacidade de permitir a mudança que melhore a sociedade como um todo. Contudo, nos dias de hoje, a maior parte das pessoas não está ainda preparada para mudanças na sociedade, tanto do ponto de vista emocional como do intelectual.

Uma vez livres dos fardos associados à sobrevivência as pessoas teriam tempo para dedicar aos seus interesses pessoais como prolongar e aumentar a sua educação que, uma vez disponível para todos e sem custos monetários associados, se poderia tornar num processo sem fim. As cidades do futuro seriam universidades vivas com a maior parte da população a frequentar aulas em escolas e faculdades com a possibilidade de participar igualmente em outras actividades. Haveria aulas para interessados em teatro, fotografia, pintura, ballet, e todas as outras artes em centros artísticos dedicados à música, à arte e ao teatro. Haveria a possibilidade de as pessoas se deslocarem a esses centros para trabalharem ou receberem ajuda com as suas novas invenções e criações.

Novos horizontes se abririam para pessoas que nem sequer ousavam sonhar com essas possibilidades no passado devido a falta de tempo ou dinheiro. Chega a ser doloroso imaginar uma vida de ilimitadas possibilidades para aqueles que têm um poder de compra actual muito limitado.

Hoje temos muitos barcos atracados nas docas mas são raramente utilizados pela grande maioria das pessoas por causa do seu preço proibitivo para a maioria da população. Nesta nova sociedade haveria barcos em número mais do que suficientes para uso livre de todos. Poderia também crescer exponencialmente o número de pessoas a aprender a pilotar aviões devido à sua disponibilidade técnica e pedagógica. A estes exemplos podemos juntar um sem número de “hobbies” que estariam disponíveis para usufruto de todos em qualquer altura e nível de aprendizagem.

Imagina um mundo aberto à exploração de todos, com muitas pessoas viajando por esse mundo fora, ajudando em áreas menos desenvolvidas no sentido de as trazer para os mais altos padrões de vida possíveis e no mais curto espaço de tempo. Um mundo onde não haveria pedintes implorando algumas moedas para sobreviver e onde não haveria limites monetários para empreender pesquisas científicas e médicas. Além disso, é sabido que os programas de pesquisa no campo médico são mais bem sucedidos quando as pessoas podem participar e aprender com eles. Este tipo de processo seria aplicado de forma semelhante em todas as outras áreas da sociedade permitindo resultados igualmente proveitosos.

Ao invés da especialização em determinado campo do conhecimento, parece mais razoável que a maioria das pessoas se tornasse mais generalista, aprendendo mais sobre diferentes disciplinas e sobre a forma com elas se relacionam entre si. Deste modo estariam também mais aptas a participar no desenvolvimento de ideias novas em mais áreas da sociedade e até da ciência. Haveria tanta expansão do conhecimento e exploração experimental em todas as áreas que deixaria de ser necessária a preocupação sobre quem decide que experiências devem ser levadas a cabo ou não. Cada novo projecto seria submetido a exploração, testes e avaliações e aqueles que se afirmassem como válidos seriam de facto construídos ou executados.

As pessoas tirariam grandes vantagens das oportunidades de aprender como comunicar melhor com os outros e resolver as suas diferenças sem recurso à violência e, na mesma linha de actuação, ser-lhes-iam fornecidas ferramentas para resolução de problemas que lhes permitiriam depois participar numa vasta variedade de campos do conhecimento e respectivas explorações empíricas.

A noção de entrega total ao ócio ou reforma após uma vida de trabalho tornar-se-ia obsoleta, uma vez que as pessoas disporiam de tantas opções de ocupação do seu tempo que, pela primeira vez nas suas vidas, poderiam perceber o que realmente significa ser membro de uma sociedade global sem que tenham precisamente tempo para fazer tudo o que se encontra à sua disposição e que gostariam de experimentar.

Sem o desperdício de tempo, recursos, vidas e energia consumida pelas guerras e pela preparação para essas guerras, as nossas energias poderiam ser canalizadas em direcção a empreendimentos verdadeiramente construtivos e benéficos para todos. A sociedade seria capaz de dedicar muito mais tempo e recursos a controlar variáveis imprevisíveis como tsunamis, tremores de terra, furacões e outros desastres naturais que ameaçam as nossas vidas. Isto não significa perfeição. Há sempre desafios e problemas não resolvidos, mas é inquestionável que haveria um grande melhoramento nos estilos de vida e a sociedade global poderia atingir os mais altos padrões de vida possíveis para a sua época, tanto materialmente como espiritualmente.

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