Carlos Guerra, presidente do Instituto da Conservação da Natureza (ICN) durante o período em que o polémico projecto de outlet da Freeport em Alcochete recebeu luz-verde do Estado, começou a trabalhar dois anos depois como consultor privado para Manuel Pedro, um dos intermediários constituídos arguidos esta semana pela suspeita de terem pago subornos em troca da aprovação ambiental do empreendimento. O ICN foi a entidade mais importante para que o licenciamento do centro comercial fosse possível. O facto de o projecto estar dentro de uma Zona de Protecção Especial (ZPE) - e por causa da legislação que regia as ZPE na altura - dava ao Instituto o poder máximo no assunto (do ponto de vista técnico), logo a seguir ao ministro do Ambiente, José Sócrates (que tinha a decisão política), tornando os pareceres vinculativos. Isto é: caso não houvesse parecer favorável do ICN, o Freeport nunca poderia ter sido construído. Em Junho de 2001, como o Expresso já noticiou há três semanas, dois técnicos do ICN - António Bruxelas e Henrique Pereira dos Santos - escreveram num parecer: "O projecto não poderá ser aprovado nos termos em que é apresentado" e "não faz sentido prosseguir o processo" de avaliação de impacte ambiental, "tendo em conta que contraria formalmente o previsto no Plano Director Municipal de Alcochete (...) e a Reserva Ecológica Nacional". No entanto, depois de os dois técnicos terem sido afastados do processo, em Setembro desse mesmo ano, foi emitido um novo parecer do ICN em Outubro, o qual, apesar de ter levado a um chumbo do Freeport na altura, já apontava para a viabilização do centro comercial meses depois (Março de 2002), desde que fossem feitas algumas alterações na proposta apresentada pelos promotores. Esse novo parecer seria a peça-chave para a Declaração de Impacte Ambiental positiva assinada pelo secretário de Estado do Ambiente Rui Gonçalves. (...)
Sobre Carlos Guerra:
Presidente do ICN (Instituto da Conservação da Natureza) entre 1998 e 2002, quando Elisa Ferreira e José Sócrates foram ministros do Ambiente e durante a aprovação de impacte ambiental do Freeport em tempo recorde. O ICN foi a entidade mais importante nos pareceres para a luz-verde do projecto de 'outlet'. Consultor privado na área do ambiente entre 2002 e 2005, até ser nomeado, com o governo PS novamente no poder, director regional de Agricultura de Trás-os-Montes. Director do GPP, Gabinete de Planeamento e Políticas do Ministério da Agricultura (e Pescas), desde 2008. O GPP define as linhas estratégicas dos investimentos do ministério e dos subsídios do Quadro Comunitário de Apoio para a área da Agricultura. Antes, entre 2005 e 2008, foi director regional da Agricultura. Irmão de dois procuradores: João Guerra, procurador do caso Casa Pia, e José Eduardo Guerra, destacado desde Outubro de 2007 para o Eurojust, o gabinete de ligação entre órgãos de investigação dos Estados-membros da UE e por onde têm passado as trocas de informação entre autoridades portuguesas e inglesas sobre o caso Freeport.
Notícia aqui.
Há coisas fantásticas, não há? Se um técnico, neste caso dois, emitem parecer desfavorável a determinada intenção, resolve-se o assunto da forma mais eficiente afastando-os do processo. Querem mais eficácia? Impossível! E depois temos as outras pontas soltas do novelo. Ter um irmão que nos pode informar sobre o fluxo de informação relativo a um caso onde estamos envolvidos deve dar muito jeito. Ter emprego na empresa privada que acabámos de beneficiar deve dar muito jeito. Ter à mão um técnico que aprova tudo o que lhe é pedido, mesmo se contra a lei, deve dar muito jeito. Ter amigos do partido que saibam compensar (um Director Regional da Agricultura deve ganhar bem...) os favores feitos contra a lei, dá concerteza muito jeito! É o país do põe-te a jeito...
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