20 de novembro de 2008

Os principais objectivos da política externa dos Estados Unidos da América VII. Por Noam Chomsky.

O mundo trilateral.


Desde o começo da década de 1970, o mundo tem tomado um rumo em direcção ao chamado
tripolarismo ou trilateralismo, ou seja, os três maiores blocos económicos que competem entre si. O primeiro bloco é baseado no yen, com o Japão no centro e as antigas colónias japonesas na
periferia. Retrocedendo aos anos 1930 e 1940, o Japão apelidou essa realidade como Grande Esfera da Co-Prosperidade da Ásia Oriental. O conflito com os Estados Unidos nasceu da tentativa de o Japão exercer ali o mesmo tipo de controle que as potências ocidentais exerciam nas suas respectivas esferas. Mas após a guerra nós (EUA) reconstruímos a região para eles. E não tivemos, então, nenhum problema em que oJapão a explorasse - só que agora o Japão teria de explorá-la sob o nosso abrangente poder. Há muitas tolices escritas acerca de como o Japão, de facto, se tornou um grande competidor, que provam que somos honrados e fortalecemos os nossos inimigos. As verdadeiras opções políticas, entretanto, eram mais estreitas. Uma era restaurar o império japonês, mas agora sob o nosso total controle (essa foi a política seguida). A outra opção era ficar fora da região e permitir ao Japão e ao resto da Ásia seguirem caminhos independentes, excluídos da "Grande Área" de controle norte-americano. Isso era impensável. Além disso, depois da Segunda Guerra, o Japão não era considerado como possível concorrente, mesmo num futuro remoto. Especulou-se talvez, a certa altura dos acontecimentos, que o Japão seria capaz de produzir algumas bugigangas, nada mais que isso. Havia uma forte componente de racismo nessa convicção. O Japão recuperou-se em grande parte por causa da Guerra da Coreia e depois com a Guerra do Vietname, que estimulou a produção japonesa e trouxe enormes lucros ao Japão.

Alguns estrategas, logo no início do pós-guerra, foram mais perspicazes, entre eles George
Kennan. Ele propôs que os EUA estimulassem o Japão a industrializar-se, mas com um limite: os EUA controlariam a importação do petróleo japonês. Kennan disse que isso nos daria "poder de veto", se acaso o Japão saísse fora da linha. Os EUA seguiram esse conselho, mantendo o controle do abastecimento e das refinarias de petróleo. Ainda no início da década de 1970, o Japão controlava somente cerca de 10% do seu próprio abastecimento de petróleo. Esse é um dos principais motivos pelo qual os EUA se têm interessado tanto pelo petróleo do Médio Oriente. Não precisávamos do petróleo para nós mesmos; a América do Norte liderava, até 1968, a produção mundial de petróleo. Entretanto, queremos realmente manter as mãos na alavanca
do poder mundial, e assegurar-nos que os lucros fluam principalmente para os Estados Unidos e
para a Inglaterra. É por isso que mantemos bases militares nas Filipinas. Elas são parte de um
sistema global de intervenção apontada para o Oriente Médio, para garantir que as forças locais não sucumbam ao "ultranacionalismo".

O segundo maior bloco competitivo está baseado na Europa e é dominado pela Alemanha, que está dando um grande passo em direção à consolidação do Mercado Comum Europeu. A Europa tem uma economia mais forte que a dos Estados Unidos, além de uma população maior e mais bem instruída. Se um dia ela agir conjuntamente e se tornar um poder integrado, os EUA poderão tornar-se uma potência de segunda classe. Isso é provável com uma Europa dirigida pela Alemanha, tomando a liderança na restauração da Europa Oriental, no seu tradicional papel de colónia económica, basicamente em parte do Terceiro Mundo.

O terceiro bloco é dominado pelos Estados Unidos e baseado no dólar. Foi recentemente ampliado com a inclusão do Canadá, maior parceiro comercial, e logo incluirá o México e outras partes do hemisfério, por meio do "tratado de livre comércio", projectado, em primeiro lugar, para os interesses dos investidores norte-americanos e seus associados. Nós sempre assumimos que a América Latina nos pertence por direito. Como Henry Stimson (secretário de Guerra, sob FDR e Taft, e secretário de Estado de Hoover) uma vez declarou "a nossa regiãozinha, logo ali, que nunca incomodou ninguém". A consolidação do bloco, baseado no dólar, significa que o esforço para frustrar o desenvolvimento independente na América Central e no Caribe vai continuar.
A menos que você entenda as nossas lutas contra os nossos rivais industriais e do Terceiro Mundo, a política externa norte-americana parece ser uma série de erros ocasionais, inconsistentes e confusos. Na verdade, os nossos líderes têm sido mais que bem-sucedidos, dentro dos limites das suas possibilidades, nas tarefas a eles atribuídas.

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